Análise e Opinião

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IA, Nasdaq e big techs | Carta aos Investidores JUL 2022

Por
Thiago Goulart

Toda inovação vem acompanhada de desafios. Se contarmos as inovações acompanhadas dos avanços na computação quântica com a Inteligência Artificial (IA), bem como seu uso mais disseminado, a modelagem da relação homem-máquina ganhará radicais contornos.

É esse o mundo de inovação tecnológica que vivenciamos. A Inovação e a inventividade são, sem dúvida, os mais poderosos determinantes das condições de um país. É só pensarmos em todas as coisas que foram descobertas ou inventadas nos últimos 150 anos:

O telefone (1876), a lâmpada elétrica (1879), o veículo movido a combustão interna (1885), o rádio (1895), o cinema (1895), o avião (1903), a TV (1926), os antibióticos (1928), o computador (1939), as armas nucleares (1945), as usinas nucleares (1951), o GPS (1973), as câmeras digitais (1975), as compras on-line (1995), as redes sociais (1997), o wi-fi (1998), o iPhone (2007) etc.

Segundo Stuart Russell, cientista da computação britânico conhecido por suas contribuições para a IA, tudo que a civilização nos oferece é produto de nossa inteligência e ter acesso a uma inteligência consideravelmente maior será o acontecimento crucial da história humana.

As máquinas são benéficas na medida em que suas ações sejam capazes de atingir nossos objetivos. A grande questão é a incerteza quanto aos nossos objetivos, pois deveria implicar que as máquinas sempre se submeterão aos humanos.

“No campo da teoria de controle, que projeta sistemas de controle para tudo, de jumbo-jatos a bombas de insulina, o trabalho do sistema é minimizar uma função custo que costume medir algum desvio de um comportamento desejado. No campo da economia, mecanismos e políticas são projetados para maximizar a utilidade de indivíduos, o bem-estar de grupos e o lucro de corporações. Em pesquisa operacional, que resolve complexos programas logísticos e de fabricação, uma solução maximiza uma esperada perda de função que define o custo de cometer erros de predição.”

O resultado está nas novas formas de relação entre seres humanos e máquinas. Projetar o passado para a frente é, no geral, uma prática razoável. Nesse sentido, é bom estar preparado para surpresas, pois o futuro será bem diferente do que se espera, vis-à-vis os lucros espetaculares das empresas de tecnologia durante a pandemia.

Porém, no centro de Nova York, rodeada por luzes e painéis eletrônicos da Times Square, fica a Nasdaq, a bolsa de valores especializada em empresas de tecnologia. Pois é… até 15 de junho, o índice Nasdaq caiu quase 32%. No acumulado do mês de junho, houve certa recuperação fechando em -8,71%.

No acumulado do ano, as três principais referências de Wall Street foram penalizadas, com retração de 15,31% (Dow Jones), 20,58% (S&P500) e 29,51% (Nasdaq). Com a queda superior a 20% do S&P 500, o índice registrou seu pior primeiro semestre desde 1970, segundo a Dow Jones Market Data. O índice Dow Jones fechou o mês de junho com perda acumulada de 6,71% e o S&P 500 -8,39%.

Ao longo de junho, o mercado parece ter virado uma chave importante. A preocupação principal dos agentes passou a ser a recessão, ao invés da inflação. E por que essa mudança é importante? O preço de uma ação ou de um índice de ações é, de forma simplificada, função da multiplicação entre o índice Preço/Lucro (P/L) e a estimativa de lucros.

A recente estabilização das taxas de juros americanas também estabilizou o P/L do S&P500. Porém, um risco adicional de curto prazo é uma revisão negativa de estimativas de lucros. 

Ibovespa
-11,50%

 

CDI
+1,02% 
Poupança +0,65%

 

IFIX
-0,88% 
BTC
-36,0% 
Dólar
+10,13% 
S&P 500
-8,39% 
Dow Jones -6,71%

 

Nasdaq
-8,71% 

Ouro
-7,60%

 

Nem as chamadas big techs (ver gráfico abaixo), como a Meta (controladora do Facebook), Amazon, Netflix, Apple e Alphabet (controladora do Google), escaparam. Um dos motivos pode ser dado à alta do custo do crédito, tornando mais atraentes os investimentos em bonds do Tesouro norte-americano, o que fez com que parte do fluxo de capitais fosse redirecionado para esse tipo de ativo, que é visto como mais seguro.

No entanto, quem diria que há 20 anos (ver gráfico abaixo) nossa relação com o papel-moeda estaria em desuso. Os smartphones (ver crescimento da Apple no gráfico) combinam recursos de computadores pessoais com sistemas operacionais que permitem a utilização de inúmeros aplicativos com diversas funcionalidades. Os contratos são assinados digitalmente pelo DocuSign; a transformação e a facilitação do cotidiano não param.

Imagine uma companhia que concentra seu esforço no e-commerce, computação em nuvem, streaming e inteligência artificial. Este é o caso da Amazon. Nos mercados e na vida, para ser bem-sucedido é preciso apostar nas vanguardas que se obtém por meio da evolução que leva a melhorias de produtividade, mas não agressiva a ponto de acabar sendo derrubado por ciclos e solavancos no caminho.

google finance
Fonte: Google Finanças. Fechamento da cotação 01/07.

Você acredita que a inovação e tecnologia vão parar? Esta nova realidade é e será a tônica desta e da próxima década. A computação quântica com IA, por exemplo, estará para computação tradicional como o computador estava para o ábaco, conferindo à humanidade um poder muito mais vasto de ver, entender e moldar as coisas.

Apesar da formação de grupos gigantes em tecnologia e comunicação, o Congresso americano tem avançado com propostas para a quebra de possíveis monopólios no ramo da comunicação, por exemplo. Isso será um longo processo, assim como vivemos na época dos Robber Barons, os ricos e poderosos empresários norte-americanos do século 19.

Como se vê, os Estados Unidos se encontram no topo dessas medidas de vanguarda, acompanhados pela China, sobretudo devido à fatia americana do gasto global em pesquisa, pesquisadores e sua liderança em outras áreas, como financiamento de risco.

O vencedor da disputa em inovação e tecnologia é, na maioria dos casos, também o vencedor das guerras econômica e militar.

Perspectivas para o segundo semestre de 2022

No Brasil, o Ibovespa sofreu junto com os mercados internacionais, acentuado pela queda forte nas commodities, causada pelo aumento do risco de recessão. Além disso, o crescimento da preocupação com o fiscal, impactado pelos subsídios que o governo brasileiro vem tentando impor na economia como forma de conter a inflação, aumentou a percepção de risco em relação ao país.

Com isso, a Bolsa brasileira também terminou o mês com uma forte queda de -11,5%, zerando os ganhos do ano e fechando a primeira metade do ano com -6,0%. Apesar da forte correção em junho, o Brasil continua se mantendo como uma das melhores bolsas do mundo. O Ibovespa segue consolidando então sólidos resultados nos primeiros meses do ano no relativo.

Segue o gráfico da XP Investimentos com uma retrospectiva dos principais acontecimentos do semestre. A partir da linha do tempo, colocamos nossa perspectiva para o segundo semestre de 2022.

grafico bolsa 1S22
Fonte: Raio-XP.

Atividade econômica

Em abril, os indicadores mostraram desaceleração no ritmo de crescimento da economia. Com os serviços estagnados na margem, o varejo teve surpresa positiva, enquanto a indústria continuou a sofrer com gargalos de logística.

O cenário de crescimento do PIB para o segundo trimestre é de alta de 0,4% em relação ao primeiro trimestre de 2022. Ainda há espaço para recuperação de algumas atividades dos serviços. Porém, pelo lado da demanda, o consumo das famílias, mesmo crescendo também no segundo trimestre, deve ser fraco no fechamento do ano.

Espera-se também contração dos investimentos no agregado de 2022. Em função desses fatores, e após a divulgação do PIB do primeiro trimestre, elevou-se a previsão de crescimento para o ano, de 0,7% para 0,9%.

Expectativas de empresários e consumidores

Os resultados de maio das sondagens mostram continuidade da recuperação da confiança empresarial e manutenção da confiança do consumidor em patamar baixo.

Serviços, Comércio e Indústria puxam pelo lado empresarial, enquanto os consumidores ainda sentem os impactos da inflação elevada.

Os dados prévios de junho registram cenário parecido, e, apesar da melhora, ainda é preciso cautela, dado que o ambiente macroeconômico se mostra desafiador.

Com isso, é difícil imaginar cenário muito favorável para a confiança no segundo semestre de 2022.

Mercado de trabalho

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) Contínua divulgou, em sua edição de abril, taxa de desocupação de 10,5%, 0,4 ponto percentual abaixo do projetado pelo FGV IBRE.

Com ajuste sazonal, registra-se nova forte queda do desemprego, de 10,7% para 10,3%. O recuo é explicado principalmente pela aceleração da geração de postos de trabalho informais.

Adicionalmente, a taxa de participação também subiu, após seis meses de estabilidade. O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), por sua vez, teve saldo positivo pouco acima do projetado pelo FGV IBRE, de 196 mil (frente à projeção de 148 mil).

Para maio, projeta-se saldo de 200 mil, o que, com ajuste sazonal, significa criação de cerca de 193 mil vagas.

Inflação

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de maio surpreendeu o mercado, ao registrar variação abaixo da antecipada, conforme medida pela mediana das expectativas. No entanto, a média dos nove núcleos de inflação estimados pelo Banco Central (BC) registrou, em maio, a vigésima-primeira aceleração da taxa interanual, acumulando alta de 9,8%, em sinal de quanto a inflação está disseminada e persistente.

Em resposta, o Copom, em sua 247ª reunião, elevou a taxa Selic de 12,75% a.a. para 13,25% e registrou em sua Ata a necessidade de novo ajuste na próxima reunião. Mesmo assim, a inflação prevista para 2022 avança para 9,2%.

Para 2023, a estimativa avançou na direção de 4,5%, aproximando o IPCA do teto da meta de inflação do próximo ano, de 4,75%.

Política monetária

No intervalo de tempo entre as duas últimas reuniões do Copom, a mediana das expectativas de inflação para 2023, no momento considerado o horizonte relevante, subiu de 4,1% para 4,7%.

Ao mesmo tempo, de acordo com o modelo básico do BC, no cenário de referência, a inflação projetada passou de 3,4% para 4,0%. Por si só, tais informações parecem suficientemente relevantes para considerar acertada a decisão do BC de optar por “um novo ajuste [da taxa Selic], de igual ou menor magnitude”, na próxima reunião, algo que equivale a uma extensão do ciclo de aperto.

Por certo, a porta não ficou fechada para ajustes adicionais, no futuro. Análise das circunstâncias que cercam o nosso processo inflacionário sugere que, ao BC, não caberia outro tipo de decisão.

Política fiscal

A melhora dos indicadores fiscais na saída da pandemia é tão impressionante quanto controversa. A melhoria fiscal está evidentemente muito relacionada ao processo inflacionário. Com a normalização da inflação, deverá haver piora dos indicadores fiscais, pois a taxa real de juros será elevada e isso pressionará a despesa com juros e a dívida pública.

O momento mais crítico para a consolidação fiscal ocorrerá exatamente nos próximos dois anos, e culminará com a possível revisão do marco fiscal e o aumento da taxa de juros real, que já está contratado.

A situação fiscal é delicada, mas isso será transitório se a revisão do marco fiscal for capaz de reforçar, dentro da realidade política do país, o sentido de estabilidade necessário.

Para isso, é preciso garantir que recursos extraordinários sejam bem utilizados, exatamente o oposto do que se pretende fazer no momento.

Setor externo

A narrativa que suporta as otimistas projeções oficiais para o saldo comercial em 2022 parece ser frágil, já que, ao contrário do imaginado, os termos de troca estão em contração.

Com resultados comerciais mais baixos, espera-se déficit de US$ 10 bilhões na conta corrente em 2022. O baixo valor a ser financiado não sugere problemas relevantes, mas o cenário é menos confortável do que a narrativa oficial sugere.

Internacional

A mensagem básica da opção do Fed por acelerar o ritmo de ajuste da política monetária para 75 pontos, juntamente com outros sinais emitidos na entrevista pós-FOMC do presidente Powell, é no sentido de que a instituição parece acreditar que somente um aperto monetário severo será capaz de trazer a inflação para a meta, objetivo que se pretende perseguir com firmeza. Essa é a luta que o Fed parece disposto a enfrentar.

O fato de a inflação nos EUA ter se tornado uma espécie de inimigo público número 1 dá certo conforto à autoridade monetária para seguir em frente. Para a sociedade como um todo, é fundamental debelar a inflação. Nada funciona a contento numa sociedade onde a inflação se mostra excessiva.

Contudo, como é usual, colocar as coisas nos eixos tem um custo. A determinação do Fed provavelmente acarretará piora das condições financeiras internacionais e aumento do risco de recessão nos EUA em 2023.

 

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Um abraço,
Equipe Valor Investimentos

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