A análise da proposta em primeiro turno ficou para a próxima terça-feira, 12. Lira argumentou que não arriscaria votar a PEC com quórum baixo. No momento do anúncio do adiamento, 427 deputados marcavam presença. O adiamento é uma derrota do governo e uma vitória para a oposição, que tentava postergar a aprovação da proposta.
Articulada pelo Palácio do Planalto com a base governista no Congresso, a PEC aumenta o Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 por mês e concede uma bolsa-caminhoneiro de R$ 1 mil mensais, entre outras benesses, com um custo total de R$ 41,25 bilhões fora do teto de gastos – a regra que limita o crescimento das despesas do governo à inflação do ano anterior.
Aprovada no Senado na última quinta-feira, 30 de junho, a PEC teve sua tramitação acelerada na Câmara por meio de manobras regimentais. O governo tem pressa para pagar as benesses, a pouco menos de três meses do primeiro turno da eleição. A Câmara chegou a fazer hoje uma sessão deliberativa que durou um minuto. O objetivo foi contar o prazo necessário para abrir a reunião da comissão especial, que aprovou a PEC nesta tarde, antes de a matéria ir ao plenário.
O relator, deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), leu seu relatório final na noite de terça-feira, 5, mas um pedido de vistas adiou a deliberação. Como houve pedido de adiamento de votação, foi preciso contar duas sessões do plenário da Câmara para que a PEC voltasse para análise do colegiado. A primeira sessão foi realizada na quarta-feira. A segunda foi a de hoje de manhã, que começou às 6h30 e terminou às 6h31. Antes disso, a proposta foi apensada a outra PEC, que trata de biocombustíveis e cuja análise já estava avançada na comissão especial. Dessa forma, a “Kamikaze” “pegou carona” e teve tramitação rápida.
Após uma pressão do Palácio do Planalto, o relator manteve o texto do Senado. Em entrevista ao Estadão/Broadcast publicada na segunda-feira, 4, Forte chegou a dizer que negociava incluir na proposta um auxílio-gasolina a motoristas de aplicativo, como o Uber, e retirar a decretação do estado de emergência no País. No entanto, após o governo entrar em campo para impedir qualquer mudança na PEC, o relator recuou e manteve o texto aprovado pelos senadores, com apenas um ajuste de redação para evitar, segundo ele, possível ambiguidade e garantir o Auxílio Brasil de R$ 600.
Durante a votação na comissão especial, a proposta foi criticada por oposicionistas, que, apesar disso, votaram a favor. “O que nós estamos vendo aqui é um crime eleitoral do Bolsonaro”, disse o líder do PT, Reginaldo Lopes (MG), em referência ao estado de emergência colocado no texto para blindar o presidente de punições da Lei Eleitoral. A legislação proíbe a concessão de benesses às vésperas da eleição, exceto em caso de emergência ou calamidade.
“Nós estamos fissurando o arcabouço eleitoral que busca garantir equilíbrio no processo democrático eleitoral. Nós estamos avacalhando o processo legislativo”, disse o deputado Marcelo Ramos (PSD-AM), ex-vice-presidente da Câmara. “O que nós estamos fazendo é distribuição de renda”, disse, por outro lado, Danilo Forte.
Além do aumento do Auxílio Brasil a R$ 600 e da concessão da “bolsa-caminhoneiro” de R$ 1 mil mensais, a PEC prevê auxílio-gasolina a taxistas de R$ 200 mensais, a ampliação do vale-gás a famílias de baixa renda e recursos para o programa Alimenta Brasil e para subsidiar a gratuidade a idosos nos transportes públicos urbanos e metropolitanos. Todas as medidas valem somente até o final do ano.
Como mostrou o Estadão, com o aumento do risco fiscal derivado da aprovação da PEC, o mercado financeiro está exigindo taxas de juros para comprar os títulos do governo de longo prazo iguais aos que cobrava no final do primeiro do primeiro mandato Dilma Rousseff, quando a ex-presidente buscava a reeleição, assim como o presidente Jair Bolsonaro tenta agora nas eleições deste ano. As taxas de juros dos títulos longos estão hoje no maior patamar do governo Bolsonaro.
Ontem, a Frente Parlamentar em Defesa dos Caminhoneiros Autônomos e Celetistas chegou a entrar com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a tramitação da PEC. “É construção de um ‘Frankenstein’ para legalizar uma pedalada Tabajara com um único objetivo de atender a ganância eleitoreira de Jair Bolsonaro e manter as benesses a especuladores financistas com a ganância financeira de Paulo Guedes”, disse o deputado Nereu Crispim (PSD-RS), que presidente a Frente Parlamentar.
O parlamentar argumentou que a PEC fere cláusulas pétreas da Constituição, a separação dos Poderes, o Estado Democrático de Direito e o Orçamento. “A modificação proposta à Constituição não é só conferir cheque em branco aos programas e auxílios mencionados, mas a todo o orçamento e finanças públicas, afastando todos os mecanismos de controle e fiscalização do erário […]”, diz trecho do mandado.
Crispim também criticou a rápida tramitação do texto no Congresso. “A Câmara dos Deputados está promovendo avanço antirregimental para agilizar a aprovação da PEC Eleitoreira em claro desvirtuamento com apelo até de estado de emergência”, afirmou.
PROPOSTA ‘EMERGENCIAL’
Auxílio Brasil: Ampliação de R$ 400 para R$ 600 mensais e cadastro de 1,6 milhão de novas famílias no programa (custo estimado: R$ 26 bilhões);
Bolsa-caminhoneiro: criação de um benefício de R$ 1 mil (custo estimado: R$ 5,4 bilhões);
Auxílio-Gás: Ampliação de R$ 53 para o valor de um botijão a cada dois meses (o preço médio atual do botijão de 13kg, segundo a ANP, é de R$ 112,60;
custo estimado: R$ 1,05 bilhão);
Transporte gratuito de idosos: compensação aos Estados para atender a gratuidade, já prevista em lei, do transporte público de idosos (custo estimado: R$ 2,5 bilhões);
Etanol: Repasse de até R$ 3,8 bilhões a Estados para manutenção do ICMS em 12% para manter a competitividade do biocombustível em relação à gasolina;
Taxistas:
Auxílio-gasolina de R$ 200 para os taxistas ao custo de R$ 2 bilhões;
Alimenta Brasil: R$ 500 milhões seriam direcionados ao programa para a compra de alimentos de agricultores familiares