Na segunda vez em que veio ao Brasil, com uma fábrica própria, a companhia britânica já tinha um histórico por aqui. Isso porque, inicialmente, o negócio chegara em 1999 por meio da empresária brasileira Sandra Isper Rocha. Depois de conhecer a Lush lá fora, ela decidiu negociar sua vinda ao mercado brasileiro. “Fiquei fascinada pela ideia e conceito. Foram muitas ligações e insistência até sermos recebidos em Londres, pelos fundadores da Lush”, contou Sandra, nesta semana, ao Estadão.
A Lush surgiu em 1995, pelas mãos de Mark Constantine, que até os anos 1970 trabalhava como cabeleireiro na Inglaterra e ganhou fama ao desenvolver cosméticos para seus clientes. Isso o levou a ser descoberto pela The Body Shop – outra marca de apelo sustentável, hoje parte do grupo Natura & Co. -, onde trabalhou por cerca de uma década. Depois disso, resolveu empreender, criando a Lush e ampliando a aposta no caráter “artesanal” e na sustentabilidade. Hoje, a marca tem mais de 900 lojas pelo mundo.
Foi de olho nesses diferenciais que Sandra tentou trazer a rede ao País. A primeira reunião foi em 1997, e a estreia veio dois anos depois. Mas não demorou muito, segundo ela, para os problemas aparecerem. O primeiro alerta veio quando a Lush alterou o prazo de pagamento das matérias-primas enviadas da Inglaterra até a fábrica no Brasil, em Cajamar, interior de São Paulo. “Nosso prazo de pagamento era de 120 dias, sendo que os produtos demoravam cerca de 60 dias para chegar. E eles passaram a pedir pagamento à vista, o que estrangulou nosso caixa”, lembra.
Mas foi em 2004 que o problema saiu de controle, quando a matriz passou a questionar a operação da subsidiária brasileira. Na época, inclusive, enviou contadores ingleses ao Brasil. Como resultado desse embate, em 2006 a matriz interrompeu o fornecimento de matérias-primas e determinou o fim do acordo de licenciamento da marca. “Nos shoppings, meu pai e mãe eram os fiadores. Foi um prejuízo gigantesco, além de ações trabalhistas. Isso gerou um estrangulamento do nosso patrimônio.”
O PROCESSO
Sandra pede na Justiça, desde 2007, uma indenização por conta das dívidas que teve de assumir e também pelo que deixou de ganhar com o fechamento súbito das lojas, em valores atualizados. Agora, anos depois, o jogo de forças pode mudar, segundo a defesa da empresária, que encontrou um documento, protocolado e autenticado no consulado brasileiro em Londres, em que a Lush reconhece a sociedade.
“O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil, como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País. A nosso ver, isso comprova que a decisão de rescindir o contrato de licenciamento foi friamente calculada. Eles queriam tomar o mercado brasileiro”, diz Felipe Mangini, sócio do escritório Mangini Leite Siegl Mermerian Advogados, que representa Sandra. Posturas semelhantes, segundo a defesa, foram identificadas em outros países onde a Lush atuou por meio de sociedades, como Alemanha e Canadá.
A defesa aponta que, “curiosamente”, a principal loja aberta pela Lush na volta ao País, em 2014, funcionava exatamente em frente à antiga unidade que havia sido aberta por Sandra. “Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado”, diz Sandra.
Segundo o advogado, o anúncio da volta ao Brasil ocorreu logo após o processo indenizatório de Sandra ter sido extinto pela Justiça. No entanto, a decisão foi revertida em 2018, e Sandra teve de volta o direito de pedir indenização. Logo depois disso, a Lush anunciou sua saída definitiva do País.
Procurada, a Lush não retornou o pedido de entrevista.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.