A bomba fiscal pode somar R$ 280,3 bilhões, de acordo com um mapeamento realizado pela consultoria Tendências. E o desafio é grande, dado que o cenário para 2023 é de bastante incerteza. As medidas em discussão e que se desenharam ao longo da eleição presidencial deste ano não cabem no teto de gastos, a regra que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior, e, portanto, vão forçar ainda mais o novo governo a definir qual será a política para as contas públicas do País.
Será difícil fazer a conta fechar porque o Orçamento enviado pela equipe econômica para o Congresso no fim de agosto se tornou irrealista. O valor do Auxílio Brasil foi definido em R$ 405, por exemplo.
“É um cenário desafiador. Vai exigir muita vontade política e capacidade de resolver tudo isso de forma organizada e clara”, diz Juliana Damasceno, economista da consultoria Tendências e responsável pelo levantamento.
Em alguns casos, os números apurados pelo estudo podem até ser considerados conservadores. O custo anual da manutenção do Auxílio Brasil no valor de R$ 600 é estimado em R$ 52 bilhões, mas essa cifra pode crescer a depender de qual será o desenho do programa no próximo governo.
Além do pagamento do Auxílio Brasil e do aumento linear dos salários dos servidores, haverá pressões com uma conta bilionária de precatórios a ser paga e com o aumento das despesas discricionárias do governo para o mesmo patamar deste ano – o mínimo necessário, segundo a Tendências, para evitar paralisações na máquina pública.
“Por mais que o teto de gastos possa ter inúmeros problemas, eu acharia muito difícil não ter um reajuste de servidor num ano eleitoral”, diz Juliana. “O teto acabou funcionando como camisa de força.”
No campo da receita, uma importante fonte de queda de arrecadação pode se dar com a correção da tabela do Imposto de Renda para pessoa física.
Se o reajuste for feito com base na inflação acumulada ao longo do governo Jair Bolsonaro, a faixa de isenção subiria dos atuais R$ 1,9 mil para R$ 2.467,25, o que implicaria em uma perda de R$ 31,3 bilhões para o governo federal.
A futura administração também pode ter desfalques bilionários com a manutenção do corte do Imposto sobre Produto Industrializados (IPI), prorrogação da desoneração de tributos federais sobre combustíveis e desonerações de diferentes setores.
“Não tem fundamento renovar a desoneração de combustíveis, num cenário em que o governo prevê que os grandes dois vetores, o preço do barril Brent e o câmbio, estarão comportados”, afirma Juliana. “Eu até acredito que, de alguma forma, essa medida possa cair. Estamos falando de algo da ordem de R$ 53 bilhões. Não é pouca coisa. Quanto mais a gente abre mão de receita em algum setor, mais deveríamos cobrar de outros, porque ainda estamos num cenário de déficit. A conta não fecha.”
CENÁRIO NEBULOSO
Os riscos fiscais para 2023 vão deixar o quadro das contas públicas ainda mais nebuloso.
O rumo das finanças públicas se transformou no principal nó da economia brasileira. Neste ano, os analistas até projetam um superávit para o governo central – será o primeiro desde 2013 -, mas eles dizem que essa melhora é pontual.
Em 2022, a arrecadação do governo tem sido beneficiada pelo crescimento econômico acima do esperado – as projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano já se aproximam de 3% -, inflação elevada e alta dos preços das commodities, como petróleo e minério de ferro.
“O cenário de uma desaceleração da atividade econômica no ano que vem, caso se materialize, será mais um novo risco e não está contemplado no levantamento”, afirma Juliana.
Para o próximo ano, as previsões para o crescimento da economia estão próximas de 0,5%, a inflação tende a ceder, e a expectativa de uma recessão global deve contribuir para um preço mais baixo de produtos básicos.
“Com a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600, projetamos um déficit de 1% e a dívida subindo para 82%, um patamar considerado elevado para os padrões de um país emergente”, afirma Daniel Couri, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado. “Será um grande desafio para o próximo governo manter a dívida num patamar sustentável.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.