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BTG se recupera, amplia espaço no varejo e quer ‘esquecer’ prisão de E

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Estadão Conteúdos

Na sede do BTG Pactual, localizada em um dos edifícios mais imponentes da avenida Faria Lima, em São Paulo, onde se concentra boa parte dos bancos e casas de investimento do País, há um clima de discreta euforia no ar.

Com um lucro recorde de R$ 6,5 bilhões em 2021, rentabilidade de 20,3% em relação ao patrimônio médio do ano e um total de R$ 1 trilhão em recursos administrados de clientes, o BTG vive uma das melhores fases, talvez a melhor, de sua história quase quarentona.

É certo que o valor de mercado do banco – que reflete a percepção dos investidores em relação à sua perfomance – teve uma queda considerável no segundo semestre de 2021, como aconteceu com quase todas as empresas com ações negociadas na Bolsa. Mas, nos dois primeiros meses do ano, a capitalização do BTG voltou a subir, aproximando-se do ponto máximo alcançado desde a abertura do capital, há dez anos.

No dia 9, o seu valor de mercado, calculado com base nas cotações dos papéis no fechamento dos negócios, chegou a R$ 95,8 bilhões, 244% a mais do que na estreia do banco nos pregões, em 26 de abril de 2012. Só para comparar, o índice Bovespa, que reflete a valorização média das ações mais negociados na B3, subiu 84% no mesmo período.

CRISE DRAMÁTICA

Pelo critério de capitalização, o BTG é hoje o quarto maior banco privado do País, atrás apenas de Itaú Unibanco, Bradesco e Santander. Está atrás também do Nubank, uma fintech que se agigantou a partir de negócios com cartões, mas ainda não foi autorizada a operar como banco, apesar do nome. O BTG está à frente, porém, da XP Investimentos, com quem trava uma disputa fervorosa pelo varejo de alta renda, a uma distância de cerca de R$ 10 bilhões.

Com tudo isso, é difícil identificar algum sinal de que o BTG enfrentou uma crise dramática, que quase o levou à lona, após a prisão de André Esteves, seu principal acionista e então presidente executivo e do conselho de administração, em novembro de 2015. A própria volta de Esteves à presidência do conselho, anunciada há duas semanas, seis anos depois de ele deixar o posto, tem o objetivo de reforçar a percepção de que o capítulo mais difícil da história do banco ficou para trás.

“O tempo esclareceu que aquilo foi um grande erro, uma das maiores injustiças da história empresarial brasileira”, diz Roberto Sallouti, que substituiu Esteves na presidência executiva do BTG após a prisão e continua no cargo até hoje, sem previsão de deixá-lo.

Embora sem um posto formal, Esteves já havia voltado ao grupo de controle, do qual Sallouti também faz parte, em dezembro de 2018, logo após ser absolvido no processo que o levou à prisão, em que era acusado de tentar obstruir investigações da Lava Jato. Como “sócio sênior”, também já vinha participando ativamente das decisões e dos principais negócios da instituição desde abril de 2016, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) revogou a prisão domiciliar que lhe foi imposta depois de deixar o presídio Bangu 8, no Rio, onde ficou detido por 23 dias. Na prática, portanto, o seu retorno ao comando do conselho não deve mudar muita coisa no dia a dia do BTG.

‘MALUQUICE’

Com uma fatia estimada entre 20% e 30% do capital total e com o respeito e a admiração dos principais sócios e gestores, Esteves nem precisaria de uma placa para legitimar a sua atuação no banco. Mas ele mesmo quis dar um sinal claro de que o episódio da prisão foi superado. “Ele estava querendo acabar com o rabo daquela maluquice de 2015, assumindo uma função formal no banco”, diz Sallouti.

Basta, porém, uma conversa despretensiosa com um dos principais acionistas ou com um dos executivos do BTG para perceber que o problema não foi totalmente resolvido. Se dependesse da turma do banco, o assunto seria esquecido para sempre – e dá até para entender o porquê. Afinal, de repente, o BTG viu a sua sobrevivência ameaçada e o seu principal acionista ser levado para o xilindró. Ainda assim, a própria resistência em falar abertamente sobre a questão revela que ainda gera desconforto no banco.

Para Sallouti concordar em colaborar com esta reportagem, foi necessária uma longa negociação. Uma hora antes do horário marcado para a entrevista, ainda houve uma tentativa da assessoria de imprensa de condicionar a sua realização ao compromisso do repórter de não mencionar a prisão de Esteves e os seus desdobramentos na instituição No fim, ele acabou aceitando falar sobre o tema, mas apenas de forma breve, sem entrar nos detalhes do processo.

ONDA DE SAQUES

Esteves, ao saber que a reportagem abordaria a questão, preferiu não participar, mesmo se fosse para falar só sobre o cenário político e econômico do País e a estratégia de mercado do banco. Não queria aparecer num contexto em que sua prisão estaria em foco. “Tudo aquilo foi muito dolorido”, diz Sallouti.

De um jeito ou de outro, o que causa muita dúvida por aí é como o BTG conseguiu dar a volta por cima, em tão pouco tempo, depois de enfrentar uma onda bilionária de saques dos clientes, perder negócios polpudos e ainda sofrer danos significativos na imagem. Isso sem falar na dispensa de funcionários qualificados, nos quais o banco vinha investindo havia anos. Qual foi a “mágica” do BTG para se reerguer e chegar aonde está hoje, com ainda mais musculatura do que tinha antes?

Na avaliação de Luiz Cezar Fernandes, ex-presidente e um dos fundadores do velho banco Pactual, que deu origem ao BTG, um fator fundamental foi ter liquidez para honrar os saques no pior momento da crise, entre o fim de 2015 e o começo de 2016. “Eles venderam ativos sem se preocupar em ganhar ou perder dinheiro e deram liquidez a quem pediu”, diz. “Quando os clientes viram que o banco estava garantindo os saques, ficaram mais tranquilos e acabaram voltando depois.”

Com grande agilidade, o BTG vendeu carteiras de suas operações para os bancões, negociou participações que detinha em empresas não financeiras, como a Rede D’Or, repassada para o fundo soberano de Cingapura por R$2,4 bilhões, e obteve um empréstimo de R$ 6 bilhões no Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que foi assegurado com parte da carteira de crédito do banco, fianças e patrimônio dos controladores.

‘GOLPE’

Outro ponto importante para o BTG se reerguer rapidamente, segundo Fernandes, foi a “cultura forte” de partnership (parceria), pela qual os principais executivos viram sócios e discutem as questões mais relevantes em conjunto, antes de tomar uma decisão. “A questão cultural é tão latente no BTG que, quando o banco se recuperou, voltou com mais força, como um tsunami”, diz.

No auge da crise, porém, até essa cultura que marcou o banco desde a fundação, em 1983, balançou. Fernandes conta que, quando Esteves voltou ao BTG após a Justiça levantar a sua prisão domiciliar, encontrou a “cama armada”. Na sua ausência, um grupo de sócios vinha se articulando para tirá-lo do negócio e assumir o controle.

A manobra, conforme o relato de Fernandes, acabou sendo frustrada, porque Esteves teve o apoio de uma ala majoritária dos sócios, da qual Sallouti faz parte, e foi comprando as participações dos envolvidos, levando-os, um a um, a deixar a instituição. “O André é muito inteligente e aplicado, e fez o jogo certo”, afirma.

ALTA RENDA

Além disso, o banco ampliou a sua atuação no mercado, apostando em áreas que não despertavam interesse no passado, para diversificar as suas fontes de receita e turbinar o lucro. Maior banco de investimento da América Latina, o BTG se concentrava nas operações de atacado, voltadas para grandes empresas e investidores institucionais, e na gestão de recursos de multimilionários e de tesouraria.

A partir de 2016, quando a situação começou a se acalmar, o BTG decidiu entrar para valer no varejo bancário, por meio de sua plataforma digital, destinada aos clientes de alta renda e às pequenas e médias empresas. Por meio do banco Pan, do qual detém o controle, com 75% do capital, o BTG também está expandindo os seus tentáculos na clientela de menor poder aquisitivo, que busca um banco transacional, para pagar as suas contas e fazer transferências, de preferência de graça, e para obter crédito.

Para acelerar o seu crescimento no varejo de alta renda e no atendimento aos negócios de pequeno e médio portes, o BTG investiu bilhões na compra do controle ou de participações minoritárias em diversas empresas que operam nos dois segmentos e também na área de tecnologia.

CUSTOS BAIXOS

Ironicamente, foi a ideia de entrar no varejo bancário que acabou levando Luiz Cezar Fernandes a deixar o antigo Pactual em 1999, depois de entrar em conflito com sócios com pequena participação na época, entre eles Esteves. “Ele estava adiantado”, diz Sallouti. “Lá atrás, a ideia dele era entrar no varejo com a criação de uma rede de agências e o uso de mão de obra intensiva. Hoje, é possível fazer isso de forma digital, com custos relativamente baixos, e alcançar bons resultados, como estamos fazendo.”

Talvez o BTG ainda tenha de passar por uma “terapia de grupo” para absorver de vez a prisão de Esteves e o seu impacto no banco. Um dia, quem sabe, o próprio Esteves se sentirá à vontade para falar sobre tudo o que aconteceu, apesar das cicatrizes profundas que o episódio deixou nele. Mas, nos negócios, o BTG já está mostrando que saiu da crise com saúde redobrada e que ainda é um dos bancos mais dinâmicos da praça, com uma capacidade invejável de geração de resultados. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.