A guerra na Ucrânia acrescenta uma pressão adicional nas cotações do petróleo: caso nada mais aumente em abril, apenas o reajuste de combustíveis feito em março pela Petrobras elevará essa taxa para 22,08%.
“Combustível é o foco (da inflação em abril), mas, com a retomada das atividades pós-pandemia, a gente pode ver novos reajustes em serviços que estavam meio congelados, como oficina, por exemplo”, previu Matheus Peçanha, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV/Ibre).
No lado dos produtos, os dados mais recentes do IPCA, referentes a fevereiro, mostram que os automóveis novos já acumulam alta de 22,94% em 18 meses de aumentos consecutivos, apurou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“Movimento semelhante ocorre em automóveis usados e motocicletas. A explicação por trás é exatamente a mesma, o setor automotivo tem sido um dos mais impactados pelo desarranjo das cadeias produtivas”, afirmou Pedro Kislanov, gerente do Sistema Nacional de Índices de Preços do IBGE, à época da divulgação dos números.
O automóvel usado já sobe há 20 meses, com alta acumulada de 22,66%. As motocicletas sobem há 15 meses seguidos e já ficaram 17,72% mais caras no período. Outros serviços correlacionados também tiveram aumento, como seguro voluntário, emplacamento e conserto.
Graças à demanda aquecida, o setor automotivo é o único entre os dez que integram o comércio varejista ampliado que tem conseguido repassar ao consumidor quase integralmente a elevação de preços dos produtos na porta de fábrica, conforme levantamento do economista Fabio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
Peças
Nos 12 meses terminados em janeiro de 2022, os preços de produtos da indústria automotiva ficaram 17% mais altos na porta de fábrica. No varejo, a alta de preços ao consumidor nas lojas de veículos e motos, partes e peças foi de 16,5%. Isso significa que 96,8% do aumento de custos do atacado foi repassado ao cliente final, calculou Bentes. “O setor está tentando retomar a margem de lucro que perdeu durante o período mais crítico da pandemia”, avaliou Bentes.
A indústria automobilística foi afetada pelo desarranjo das cadeias produtivas e pela falta de insumos, mas também pelo aumento de custos de matérias-primas e de energia, apontou André Braz, coordenador dos Índices de Preços do FGV/Ibre. “Se a indústria automobilística não conseguia atender o mercado, isso ajudou a aquecer o mercado de usados. Os automóveis novos subiram tanto quando os usados. Se não tinha peça, o carro fica mais escasso, isso provoca um choque de oferta”, disse Braz.
Preços altos e juros elevados devem afastar cliente
O sonho do automóvel novo ficou mais distante para os brasileiros. Os preços mais elevados e a alta das taxas de juros no financiamento esfriarão a demanda, preveem especialistas.
Após dois anos de fortes reajustes, o preço médio dos “hatchbacks”, categoria que inclui os carros mais baratos, ficou em R$ 79 mil em janeiro deste ano, segundo Cassio Pagliarini, da Bright Consulting, consultoria especializada no setor automotivo. Em 2016, o preço médio era de R$ 48 mil. Corrigindo pela inflação, seria o equivalente a R$ 62 mil.
O crédito mais caro deve servir para desacelerar os aumentos nos próximos meses, mesmo com a persistência de encarecimento de custos, estima o economista Fabio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). “Nenhum segmento do varejo depende tanto do crédito quanto o automotivo. Essa tentativa de recomposição de margem (de lucro) não vai longe.”
A taxa média de juros para aquisição de veículos foi de 26,86% em janeiro de 2022, segundo dados do Banco Central (BC) compilados por Bentes.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.