Nas projeções do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre), o PIB do País deve avançar 0,6% em 2022, com o PIB da agropecuária crescendo 3,5% e o de serviços, 1,3%. Já o da indústria deve ter queda de 1,1%, com a indústria de transformação registrando a pior performance: recuo de 3,2%.
Já para o Itaú Unibanco, o PIB deve cair 0,5%. Agronegócio e serviços, porém, crescerão 1,3% e 0,5%, respectivamente, enquanto a indústria recuará 3%. O banco não tem estimativa apenas para o segmento de transformação.
O quadro preocupa sobretudo porque a indústria é o setor mais gera empregos formais. Cálculos do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), com base em dados do IBGE, mostram que, na média de 2019 a 2021, 63,9% da força de trabalho da indústria tinha carteira assinada. Nos serviços, a proporção foi de 40% e na agricultura, de 16,6%.
No caso da indústria da transformação, o efeito multiplicador na economia também é mais elevado. Cada R$ 1 gerado pelo segmento leva ao acréscimo de R$ 2,14 no PIB. No setor de serviços, o efeito é de R$ 1,46; na agropecuária, de R$ 1,67, aponta o Iedi.
Indústria sofre mais com aperto monetário
Mais sensível a ciclos econômicos do que os demais setores, a indústria deve sofrer em 2022 sobretudo devido ao aperto monetário. Há um ano, a taxa básica de juros, a Selic, era de 2%. Hoje, está em 10,75% e a expectativa do mercado financeiro é que chegue a 12,25%. Como a demanda da indústria depende do acesso ao crédito, uma alta de dez pontos porcentuais no juro deve travá-la.
“Quem consome serviços não costuma usar crédito. Já no setor industrial, o crédito é importante. Por isso, a indústria é mais sensível”, afirma o economista Luka Barbosa, do Itaú Unibanco.
A economista Claudia Perdigão, do Ibre, lembra que a inflação tem corroído o poder de compra das famílias, que passaram a repensar a aquisição de bens de maior valor. Para ela, apesar de a inflação esperada para 2022 ser mais baixa do que a registrada em 2021 (5,5% ante 10%), a tendência de segurar a compra de bens duráveis deve continuar nos próximos meses.
Claudia também afirma esperar que haja uma migração de demanda da indústria para os serviços. Como no começo da pandemia os consumidores ficaram em casa, deixaram de consumir com lazer e gastaram equipando suas casas com TVs e computadores, agora, com a abertura da economia, deve ocorrer um movimento inverso. Barbosa, no entanto, pondera que esse efeito pode ter ocorrido no segundo semestre de 2021 e já ter se encerrado.
Já o economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), considera o cenário para a indústria em 2022 “bastante restringido”. O IEDI não trabalha com projeções, mas Cagnin destaca que a indústria passa por uma fase adversa desde 2014. Sem crescimento sustentável e sem acumular lucros, investimentos em modernização ficaram cada vez mais difíceis. Esses investimentos devem ser improváveis também em 2022 devido às eleições. “A eleição é um fator de incerteza a mais. Como não se sabe qual será a agenda econômica dos próximos quatro anos, decisões importantes de investimento ficarão paralisadas”, diz Cagnin.
Cadeias produtivas
Outro fator que prejudicará a indústria – ainda que de forma mais suave que em 2021 – será a falta de matérias-primas. Com a interrupção de cadeias de produção causada pela pandemia, produtos como embalagens e semicondutores desapareceram do mercado. Dados da FGV indicam que o pior momento da escassez de insumos foi em dezembro de 2020, quando o nível de estoque ficou quase 30% abaixo do planejado. A partir daí, a situação foi melhorando gradativamente, mas, em janeiro deste ano, voltou a recuar, ficando 10% abaixo do esperado.
O problema resiste principalmente no setor automobilístico, responsável por 10% da indústria. Os economistas afirmam que o entrave deve continuar até meados de 2022. A questão é que, a partir de julho, a alta da Selic pesará mais para os consumidores. “Aí a demanda vai estar em níveis bem mais baixos por causa da taxa de juros elevada. Isso se tornou um pouco uma corrida. A produção subirá se os insumos vierem mais rápido do que a demanda cair. Mas achamos que os insumos só estarão normalizados quando a demanda já estiver mais deprimida”, afirma Barbosa.
Apesar do panorama de recessão para a indústria traçado pelos economistas, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) é menos pessimista. A entidade projeta uma alta de 0,5% no PIB do setor, com os segmentos de transformação, extrativo e construção avançando 0,5%, 2% e 0,6%, respectivamente. “Alguns setores estão com muitos pedidos já em carteira. Pelas informações que temos, o de máquinas e equipamentos e o de siderurgia têm bastante encomendas de 2021 para serem entregues neste ano. Isso vai se refletir em produção”, diz o gerente executivo de economia da CNI, Mario Sérgio Carraro Telles.
Ritmo menor
Na análise do economista, o ritmo de crescimento vai cair na comparação com 2021, mas, ainda assim, haverá expansão. De acordo com estimativa do Ibre, o PIB industrial avançou 4,2% no ano passado. Telles aposta ainda na demanda reprimida por automóveis para ajudar a indústria nos próximos meses.
Para Cagnin, um dos poucos fatores favoráveis à indústria neste ano serão as exportações. Segmentos como de papel e celulose, alimentício, metais, siderurgia e automobilístico são os que têm presença mais forte no mercado internacional e podem se beneficiar de vendas externas.
A redução ou a isenção do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), conforme vem sendo aventado no governo, poderia ajudar a venda de bens para famílias. Empresas que fabricam máquinas e equipamentos, no entanto, ainda teriam dificuldade devido à taxa de juros elevada, avalia Claudia Perdigão. Para ela, uma solução para a crise da indústria depende de medidas que reduzam a burocracia e a complexidade tributária.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.