Barret diz que, nas últimas três décadas, a globalização “beneficiou os mais pobres e a classe média – muitas pessoas conseguiram escapar da pobreza”. O executivo prevê ainda que, com o impacto das tensões geopolíticas nas cadeias de produção, “nos próximos cinco, dez anos, as empresas terão de se acostumar a ser mais resilientes, estáveis e flexíveis”.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista ao Estadão:
Com a alta de juros, a economia global parece caminhar para a recessão. Como o sr. avalia esse cenário?
Podemos esperar que a demanda global continue a cair nos próximos meses, principalmente guiada pelas ações dos bancos centrais. Os BCs não têm outra escolha, e não há uma saída suave, dado que a inflação está em toda a Europa, que caminha para a recessão. Na terça-feira, o Banco Mundial também já publicou que a China, pela primeira vez desde 1990, vai ter uma taxa de crescimento menor quando comparada com a de outros países da Ásia.
São várias crises globais nos últimos anos
Nós tivemos o aquecimento global, a pandemia e, como resultado da pandemia, a interrupção da cadeia de suprimentos. Em paralelo, a pressão social está aumentando, e estamos lidando com muito mais questões geopolíticas. É difícil imaginar politicamente o que vai acontecer no mundo, não só na Itália, por exemplo. Há alguns meses, a França conseguiu lidar de forma correta com o populismo (em abril, Marine Le Pen, da direita radical, foi derrotada na disputa presidencial). Esse populismo tem muito a ver com as pessoas desapontadas. A linha desse populismo é o discurso de pessoas e dos partidos de que as coisas vão melhorar com os países isolados. E nós sabemos que não, mas, no fim, temos de aceitar, porque são as pessoas que fazem essa escolha.
Como os políticos podem mudar essa situação?
Essa é uma pergunta de US$ 1 milhão. Os países estão procurando saídas sozinhos, e isso vai resultar na redução da riqueza global. Nós vimos nas últimas três décadas uma globalização que beneficiou os mais pobres e a classe média – muitas pessoas conseguiram escapar da pobreza. A direção que muitos governos estão tomando não é necessariamente a correta, mas temos de encarar como transformar essa situação em oportunidades. Para uma geração mais antiga, a depender do país, houve relativa estabilidade nas últimas duas, três décadas, mas eu acho que, nos próximos cinco, dez anos, as empresas terão de se acostumar a ser mais resilientes, estáveis e flexíveis. A estratégia corporativa para os nossos clientes é pensar dois, três passos adiante, para evitar que eles caiam numa armadilha.
O cenário para as empresas será difícil, então, para os próximos anos?
Isso depende do tipo de negócio. Empresas intensivas em energia na Alemanha, na Europa, vão enfrentar grandes problemas, já estão enfrentando. Há casos de insolvência. Na Alemanha, temos hoje 22%, 23% menos consumo de energia do que há um ano, em parte porque as pessoas estão economizando, e já substituíram o uso do gás, mas também porque todos os setores tiveram significativo corte na produção por causa do custo da energia.
E as empresas já sofreram muito desde a pandemia…
Claro que houve desafios durante a pandemia para indústrias, restaurantes. Mas, com o auxílio estatal, muitas empresas conseguiram superar esse momento. Um exemplo interessante é o da automotiva. Muitas empresas estão com recordes de lucratividade, porque houve uma escassez de carros com a crise dos chips. Não houve carros suficientes, e os preços subiram. Como resultado da pandemia, as empresas de chips multiplicaram seu lucro por três, quatro; as fornecedoras de matérias-primas multiplicaram seu lucro por três, quatro, cinco.
Quais são os países que a Roland Berger olha com mais otimismo?
Os países das Américas, como EUA, Canadá e Brasil. O Oriente Médio está se beneficiando do aumento de preços (da energia). Há o Sudeste Asiático, países como Vietnã, Filipinas. Eu citaria a Índia. Todos estão acompanhando o que está acontecendo com a Apple, basicamente partes da sua produção deixaram a China e foram para a Índia, para ter menos influência de tensões geopolíticas. Essa é a parte positiva do mundo.
E a parte negativa?
Estamos falando da Europa, com muitos problemas estruturais. O fato de termos esses governos populistas em algumas partes da Europa torna difícil para o Banco Central Europeu encontrar uma política monetária para toda a região. A China, em muitas categorias, é o principal mercado do mundo, mas tem o desafio da estratégia de covid zero. O crescimento vai desacelerar. Vai haver uma grande mudança tectônica nos próximos dois, três anos.
O sr. poderia detalhar a situação do Brasil?
O Brasil deve estar numa boa posição, porque os preços das commodities estão em alta, e muitos países vão olhar para o Brasil para o fornecimento de produtos básicos. Isso deve ser positivo para os próximos anos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.