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‘Temos de tirar de circulação os veículos velhos’, afirma Roberto Cortes

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Estadão Conteúdos

Roberto Cortes é o mais longevo profissional do setor de caminhões do Brasil. Seu envolvimento com o mundo sobre rodas começou na Engesa, extinta empresa do setor de veículos militares. Foi para a Ford, depois para a Autolatina (holding que uniu a marca americana à Volkswagen) e participou do projeto que deu origem à Volkswagen Caminhões e Ônibus (VWCO), em 1981. A empresa foi comprada pela MAN em 2009 e, em 2018, passou a fazer parte do Grupo Traton, que também é dono da Scania e adquiriu, por R$ 3,7 bilhões, o controle da americana Navistar em 2021. O executivo paulistano, que tocou o sino da Bolsa de Valores de Frankfurt, na Alemanha, no dia da abertura de capital do grupo, falou com o Estadão ao longo de uma hora, por chamada de vídeo.

Como foi o ano de 2021 para a VWCO?

É difícil caracterizar 2021. Foi um ano cheio de desafios, porém também de conquistas e, para a Volkswagen Caminhões e Ônibus, de celebrações. Sofremos com a pandemia, nos preocupamos com a saúde dos funcionários e as consequências na economia. Tivemos grandes dificuldades no fornecimento de peças para caminhão e ônibus, principalmente semicondutores. As cadeias logísticas foram muito afetadas. Chegamos a fazer caminhões incompletos, que eram finalizados depois. Mas também vimos os resultados da vacinação, que nos deixaram entusiasmados. Além disso, celebramos os 40 anos de operação da marca, que nasceu no Brasil e tem coração verde e amarelo, e os 25 anos da fábrica em Resende. Superamos a marca de 1 milhão de veículos produzidos e, em meio à pandemia, lançamos o caminhão e-Delivery e uma nova linha de extra pesados. Contratamos quase mil pessoas e atingimos o maior número de colaboradores de nossa história. Então, eu diria que estamos preparados para 2022.

O e-Delivery, primeiro veículo elétrico feito em grande escala na América Latina, foi desenvolvido e é produzido no Brasil. Como surgiu o projeto?

Em 2013, quando começamos o projeto do novo Delivery, que foi lançado em 2017, já contemplávamos que ele teria versão elétrica, por acreditarmos na sua aplicação urbana. Na época, pouco se falava em eletrificação e redução de emissões. Saímos na frente. O desenvolvimento prático começou em 2018 e o lançamento ocorreu agora. Outra grande inovação foi o desenvolvimento local, que é uma fortaleza que a gente tem – são 600 engenheiros. Outro fator importante são os fornecedores locais. Estamos desenvolvendo uma cadeia de suprimentos no Brasil para ter escala e não depender de importações.

O que o governo deveria fazer para fomentar o setor?

Costumo dizer que o que vende caminhões e ônibus é o PIB do Brasil. Ou seja, você transporta mercadorias, que são consequência do aumento do PIB. Então, espero que o governo faça ações que incrementem negócios e criem um ambiente econômico propício para o crescimento. Além disso, falo sobre a necessidade da renovação da frota há mais de 15 anos. Ou seja, desde a transição das leis brasileiras de emissões do Euro 2 para o Euro 3. Já estamos no Euro 5, às vésperas do 6. Temos de tirar de circulação os veículos velhos, que emitem gases em excesso, ameaçam a segurança e o sistema logístico, o que contribui para aumentar o famoso custo Brasil. No nosso país, 60% das mercadorias são transportadas por caminhões velhos que, obviamente, quebram mais e têm eficiência menor. Então, ao se incentivar a troca por modelos novos, haverá ganho não só para o meio ambiente, mas também para a segurança e a economia.

O que é preciso fazer para convencer a direção do Grupo Traton de que vale a pena investir no Brasil?

O mercado brasileiro de caminhões e ônibus é estratégico para a holding. É muito grande e está entre os “top 10” do mundo, por causa da dependência do transporte rodoviário. Nosso mercado é ainda maior em ônibus – estamos entre os “top 3”. Então, a Volkswagen toma decisões de investimento pensando no longo prazo. Assim, em um ciclo de, digamos, 5 a 10 anos, o setor é atrativo para o grupo. Além disso, os investimentos são financiados pelos resultados da operação no Brasil e no exterior, o que a gente chama de autofinanciamento. A solidez das operações no País é a maior razão para que o Grupo Traton continue apoiando nossas decisões.

Houve alguma decisão que o sr. tomou e, se pudesse, faria diferente?

Todas as decisões tomadas por quem está no comando em uma empresa como a VWCO são baseadas em profundos estudos e tensos debates com os times. Nós ouvimos a comunidade científica e médica para, por exemplo, parar a produção, criar distanciamento social e tomar medidas de segurança contra a covid. Então, é preciso ouvir e nunca se colocar na posição de dono da verdade. Sobretudo em um ano como 2021, marcado por inúmeras variáveis. Na minha experiência profissional, enfrentei mais de 20 crises. Uma foi do capital externo, outra foi a da China, da Argentina… A atual é uma crise econômica, financeira e de saúde pública. Então, é ainda mais complexa. Por isso, me cerco de especialistas e considero que as decisões foram bem assertivas.

O que o sr. diria para o Cortes que estava ingressando no setor há 40 anos?

Como bom corintiano, sempre tenho 11 jogadores bons no time. Aprendi que há três fórmulas básicas na vida. A primeira é que o mundo muda a cada dia. Então, se você deixar de estudar e se atualizar, vai perder a evolução natural das coisas em todos os setores, inclusive naquele em que você atua. A segunda é algo que tem de vir de dentro. Você tem de gostar do que faz. Além disso, precisa se forçar a fazer mais e melhor a cada dia. A terceira é nunca desistir. Mesmo que você enfrente crises e frustrações, é preciso perseverar. Há uma última, que eu criei agora: a resposta é o trabalho, não adianta você reclamar. Deve responder fazendo mais do que esperam de você. Com base nos meus 40 anos de setor, digo que isso não é tão difícil.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.