Espelho do desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY saltou mais de 400 pontos, para a casa de 96,400 em poucos minutos, e as taxas dos Treasuries renovaram máximas, com a T-note de 10 anos na linha de 1,84%. A moeda americana também acelerou os ganhos em relação a divisas emergentes e de exportadores de commodities.
Com mínima a R$ 5,3936 e máxima a R$ 5,4579, o dólar à vista fechou a R$ 5,4411, em alta de 0,11%. O real, ressalte-se, sofreu menos que seus pares em meio a onda de fortalecimento da moeda americana lá fora. No acumulado de janeiro, o dólar à vista ainda acumula queda expressiva, de 2,42%. O contrato de dólar futuro para fevereiro perdeu fôlego com o mercado à vista já fechado e fechou a R$ 5,43900, em queda de 0,20%.
As reações do mercado às manifestações do BC americano foram distintas. O comunicado foi recebido de forma tranquila e, por aqui, o dólar chegou até a romper, momentaneamente, R$ 5,40. Como esperado, o Fed manteve a taxa básica e acenou com alta dos juros em breve. O fim da compra mensal de bônus virá só no início de março.
Já o discurso de Powell foi interpretado como mais duro. O presidente do BC destacou as pressões inflacionárias, ao dizer quer “há risco de que a inflação possa ser mais persistente do que o esperado” – e afirmou que, “se as condições forem apropriadas”, os juros devem subir em março. Ele reiterou também que o processo de enxugamento da liquidez deve ser mais rápido que no pós-crise de 2008. Powell se esquivou em relação ao ritmo de elevação da taxa básica, algo que “depende dos dados”, mas disse que há muito espaço para subir os juros sem afetar o mercado de trabalho.
Na avaliação do economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, o comunicado do BC americano veio em um tom moderado, afastando temores de uma postura mais dura em relação a trajetória da taxa de juros, o que explica a reação inicial amena dos ativos de risco.
“Mas o Powell foi mais hawkish, mostrando uma preocupação com a inflação que não estava nem no comunicado nem em seu discurso anterior. Isso provocou uma correção das bolsas americanas e fortaleceu o dólar”, diz Velho, ressaltando que o mercado provavelmente passará a projetar “no mínimo” quatro altas da taxa de juros nos EUA ao longo deste ano. “A questão é se vai ser tudo isso. Vejo um receio grande do Fed com uma correção muito acentuada das bolsas americanas e o impacto muito forte dos juros nas empresas”.
A economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, vai na mesma linha e afirma que a fala de Powell dá a impressão de que o Fed está “muito mais preocupado com a inflação do que estava na reunião de dezembro”, o que fez o dólar ganhar força na comparação com seus pares e encurtou o fôlego do real. “O dólar é a moeda que fundamenta a precificação dos investimentos, porque é um ativo global. Como o Federal Reserve ‘manda’ na moeda, o mundo todo olha de perto a condução da política monetária”, afirma.
Por aqui, o IPCA-15 de janeiro, acima das expectativas, não apenas reforça a perspectiva de alta de 1,50 ponto porcentual da Selic na reunião do Copom na próxima semana como sugere uma aperto maior e mais prolongado da política monetária – o que, em tese, dá suporte ao real. Juros mais elevados tendem a atrair recursos para a renda fixa e operações de ‘carry trade’, além de encarecerem o custo do hedge e desestimularem apostas mais contundentes contra a moeda brasileira.
O IPCA-15 subiu 0,58% no mês passado, desaceleração frente a dezembro (0,78%), mas acima da mediana de Projeções Broadcast (0,45%). A abertura do índice, com pressão em preços de bens e difusão elevada causaram preocupações. Com o resultado, o IPCA-15 acumulou alta de 10,20% em 12 meses.
Para Velho, da JF Trust, o dólar pode até subir um pouco em relação ao real na quinta-feira, mas não deve ter fôlego para voltar ao patamar de R$ 5,70 nos próximos dias, dado que boa parte do discurso de Powell já foi incorporada aos preços desta quarta e há apetite de estrangeiros por ativos domésticos. “O fluxo pode mudar, é claro. Mas, pelos fundamentos, a taxa de câmbio pode até voltar um pouco, embora não muito abaixo de R$ 5,40”, diz o economista. “Uma alta mais forte do dólar só se houver um descalabro na inflação americana e o mercado precificar taxa de juros de 3% nos Estados Unidos”.