As variações da taxa de câmbio ao longo do dia se deram em sintonia com o apetite ao risco e o comportamento da moeda americana no exterior. Pela manhã, na esteira de declarações do presidente russo, Vladimir Putin, de “mudanças positivas” nas negociações com a Ucrânia, investidores saíram às compras. Por aqui, o dólar à vista rompeu o piso de R$ 5,00 e desceu até a mínima de R$ 4,9851, com operadores relatando fluxo estrangeiro.
À tarde, um pacote de informações que apontam para um recrudescimento das tensões entre Ocidente e Rússia jogou o petróleo para cima e fez a moeda americana acelerar os ganhos no exterior. Em conjunto com líderes do G7, o presidente americano, Joe Biden, anunciou novas medidas contra a Rússia e houve alertas dos EUA na Organização das Nações Unidas (ONU) sobre possível uso de armas químicas pelos russos na Ucrânia, rebatidos por representantes chineses.
Com piora do humor lá fora, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes – superou a barreira dos 99 mil pontos e atingiu máxima aos 99,140 pontos, sobretudo graças ao avanço ante o euro. A moeda americana também ganhava força em relação à ampla maioria de países emergentes, com raras exceções do peso colombiano e da lira turca, além do rublo.
Por aqui, o dólar à vista não apenas voltou a ser negociado acima de R$ 5,00 como correu até a máxima de R$ 5,0586. No fim do dia, a moeda americana era cotada a R$ 5,0541, em alta de 0,76%. Apesar disso, a divisa ainda termina a semana com desvalorização de 0,48%, o que leva as perdas acumuladas em março a 1,97%. Com o mercado à vista já fechado, surgiu a informação de que transportadores de carros e de combustíveis decidiram parar e não fazer novas viagens a partir de hoje, sob alegação de que a alta dos preços dos combustíveis anunciada ontem pela Petrobrás. inviabilizou o frete. O dólar futuro para abril fechou a R$ 5,10400, em alta de 1,16%, depois de ter atingido máxima a R$ 5,11100. O giro foi de US$ 11,36 bilhões.
“O dólar já caiu bastante neste ano. Temos as incertezas da guerra e ninguém quer passar o fim de semana descoberto. Tem também essa expectativa de que o Fed pode adotar na semana que vem um tom mais duro contra a inflação, o que favorece o dólar”, afirma o gerente de câmbio, Reginaldo Galhardo, em referência à decisão de política monetária do Banco Central americano na quarta-feira (16), quando o Banco Central brasileiro também anunciará a nova taxa Selic.
Galhardo observa que, após a rodada recente de apreciação, o real experimenta um período de acomodação. Não haveria apetite para apostas mais contundentes a favor da moeda brasileira, tendo em vista as incertezas no exterior. Mas também não há espaço para montagem de posições mais fortes compradas em dólar (que ganham quando a moeda sobe), já que os juros locais são extremamente elevados e pode haver nova leva de entrada de recursos externos em ambiente de preços elevados das commodities.
“Isso faz o dólar ficar sem uma direção clara. Não tem força para subir até R$ 5,10 e, quando cai abaixo de R$ 5, já entra comprador”, diz Galhardo, acrescentando que, além dos desdobramentos da guerra, a taxa de câmbio pode começar a sentir mais a influência da elevação de juros nos países desenvolvidos e da corrida eleitoral doméstica.
A alta de 1,01% IPCA de fevereiro, acima da mediana das previsões de 0,94% na pesquisa do Projeções Broadcast, realimenta as expectativas de taxa Selic terminal acima de 13%, o que amplia o diferencial de juros e interno e, em tese, aumenta a atratividade das operações de carry trade. Por outro lado, a taxa de câmbio nominal tende a se ajustar para cima com inflação pressionada e o aperto monetário mais intenso ameaça derrubar a economia, o que pode desestimular a entrada de capitais.
Diversos departamentos econômicos de instituições financeiras – como Banco Fibra, Necton, Barclays e Citi – revisaram para cima as projeções para o IPCA deste ano, que se fixam acima de 6%. A expectativa é que, diante das pressões da inflação corrente, o Copom opte, na semana que vem, por uma alta de 1 ponto porcentual da taxa Selic, para 11,75% ao ano.
“A curva de juros deu uma forte estressada. E essa inflação ainda não reflete o reajuste dos combustíveis. A expectativa é que o processo de alta juros seja mais longo”, afirma o especialista Nicolas Farto, da Renova Invest. “A inflação é ruim, mas taxas de juros são muito atraentes. É muito difícil o estrangeiro deixar de colocar dinheiro aqui”.
Farto observa que modelos econométricos apontam para um valor justo do dólar entre R$ 4,80 e R$ 4,85, mas que a taxa de câmbio resiste a fechar abaixo do piso psicológico de R$ 5,00 muito por conta das incertezas externas, tanto relacionadas à guerra quanto ao ritmo de alta de juros nos Estados Unidos. “O Jerome Powell (presidente do Fed) já sinalizou com a alta de 0,25 ponto (porcentual). O comunicado é mais importante para se saber se ele vai acelerar para 0,50 ponto na próxima reunião e qual a alta da taxa contratada para o ano. Vamos ver como o dólar se comporta se o Fed for mais duro”, diz o especialista da Renova Invest.