A crise provocada pela pandemia de covid-19, com reflexos sobre a renda da população, derrubou o valor dos alugueis residenciais no País. No momento de redução mais aguda, em meados de 2020, os preços acumulavam em 12 meses uma queda superior a 7%, segundo os dados do Índice de Variação de Aluguéis Residenciais (Ivar), lançado nesta terça-feira, 11, pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
Após recuperação no segundo semestre, os contratos terminaram 2020 com alta de 4,08%, mas encerraram 2021 com queda de 0,61%.
Segundo Paulo Picchetti, pesquisador responsável pela metodologia do Ivar no Ibre/FGV, o setor imobiliário foi profundamente impactado pelos efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho. A perda do emprego e a queda na renda levaram a negociações entre inquilinos e proprietários, que resultaram, em sua maioria, em queda ou manutenção dos valores dos aluguéis. “Com a pandemia, a gente sabe que muita gente teve perda de renda muito repentina e muito profunda”, lembrou Picchetti.
Também apurado pela FGV, o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), índice de preços majoritariamente adotado como base para reajustes de contratos de locação, acumulou uma alta de 17,78% no ano de 2021, após já ter subido 23,14% em 2020. O resultado do Ivar, porém, mostra que a realidade financeira da população, que contribui para a dinâmica de oferta e demanda de imóveis, acabou se sobrepondo aos índices de preços que reajustam os contratos em vigor.
“A renda não subiu nessa proporção (do IGP-M), na verdade caiu. Muitos locadores se viram numa situação em que tiveram que pegar o apartamento de volta, porque os locatários não tinham condições de continuar pagando”, disse Picchetti.
Entre as quatro capitais pesquisadas, a queda acumulada ultrapassou os 10% em Porto Alegre em agosto de 2020 e em Belo Horizonte entre julho e setembro daquele mesmo ano, enquanto as cidades de São Paulo (-6,06% em agosto de 2020) e Rio de Janeiro (-8,83% em julho de 2020) registraram reduções um pouco menos acentuadas.
“De fato, houve muita negociação entre inquilinos e proprietários. Era uma coisa que a gente tinha sensibilidade, mas não tinha a informação. Não havia condições de pagar um reajuste se a família tinha perdido emprego”, justificou André Braz, coordenador dos Índices de Preços do Ibre/FGV. “Muita gente partiu para a negociação. Até porque, para o proprietário, aluguel é fonte de renda, você não pode abrir mão repentinamente. Então é melhor manter um inquilino bom pagador”, completou Braz.
Acompanhando a melhora do poder aquisitivo das famílias e da atividade econômica, em meio ao pagamento do auxílio emergencial e reabertura de estabelecimentos comerciais, os contratos de locação voltaram a mostrar recuperação ao longo do segundo semestre de 2020 nas quatro regiões investigadas, encerrando aquele ano com aumento de 4,08% na média nacional. No entanto, o índice mostrou novo freio no primeiro trimestre de 2021, época em que o País foi abatido pela segunda onda da covid-19. Desde então, a variação acumulada em 12 meses ensaiou retomada, voltando a perder fôlego no último semestre do ano passado, quando encerrou em trajetória declinante.
Dezembro
O Índice de Variação de Aluguéis Residenciais desacelerou de uma alta de 0,79% no mês de novembro de 2021 para elevação de 0,66% em dezembro. A taxa acumulada em 12 meses saiu de alta de 0,70% em novembro para terminar o ano de 2021 com uma queda de 0,61%.
Quanto aos resultados regionais, o Ivar desacelerou em duas das cidades de maior peso entre novembro e dezembro: São Paulo (de 0,78% para 0,48%) e Rio de Janeiro (de 1,46% para 1,03%). Por outro lado, houve avanço no ritmo de alta em Belo Horizonte (de 1,00% para 1,17%) e Porto Alegre (de 0,27% para 0,43%).
No ano de 2021, os aluguéis recuaram 1,83% em São Paulo. Houve redução também em Porto Alegre: -0,35%. A maior alta foi em Belo Horizonte, 1,46%, seguida por Rio de Janeiro, 0,46%.
Os pesquisadores do Ibre/FGV ressaltam que os aumentos de preços de itens inegociáveis para a população, como energia elétrica, alimentos e combustíveis, ainda prejudicam a capacidade de pagamento das famílias, ao mesmo tempo em que a geração de vagas no mercado de trabalho não tem levado a uma melhora na massa de rendimentos disponíveis.
A inflação elevada reduz a renda familiar, que também é pressionada pela apatia da atividade econômica e pelo alto índice de desemprego, enumera Braz. “Se a população não tem renda para pagar o aluguel, é provável que os contratos fiquem mais estáveis”, explica.
Mudança na coleta de dados
O Índice de Variação de Aluguéis Residenciais (Ivar) passa a medir mensalmente a evolução dos valores de aluguéis residenciais em quatro das principais capitais brasileiras com base em informações anonimizadas de contratos de locação de longo prazo obtidas pelo Ibre/FGV com empresas administradoras de imóveis e entidades de classe. Até então, os preços dos aluguéis residenciais eram apurados pela FGV tendo como base anúncios de locação.
A mudança na coleta dos dados explica as diferenças dos resultados do Ivar em relação aos outros índices que medem a evolução dos aluguéis residenciais no Brasil. No Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – 15 (IPCA-15), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o subitem aluguel residencial teve um aumento de 6,98% no ano de 2021, enquanto que no Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S, do Ibre/FGV) a alta foi de 4,45%.
“O proprietário coloca (o imóvel) no mercado, mantém aquele valor anunciado por um tempo, mas muitas vezes acaba fechando por um preço menor. A mesma coisa acontece no mercado de compra e venda”, justificou Aloisio Campelo Júnior, superintendente de Estatísticas Públicas do Ibre/FGV.
O novo índice coletará informações de cerca de 10 mil contratos por mês. A FGV tem intenção de incluir mais capitais no cálculo, mas ainda não obteve dados em quantidade e regularidade suficientes para a produção de estatísticas confiáveis, justificou Picchetti.
A próxima divulgação do Ivar, referente a janeiro, ocorrerá em 10 de fevereiro de 2022.