O pano de fundo para esse alívio visto nos últimos dias seria a acomodação do mercado às expectativas de normalização da política monetária dos Estados Unidos, com fim da compra mensal de bônus, primeira alta de juros em março e início da diminuição do balanço patrimonial no fim do ano. Também pesa a favor da moeda brasileira a escalada recente da taxa Selic, que torna mais custoso o carreamento de posições especulativas em dólar.
Na primeira hora de negócios, a moeda até esboçou uma recuperação, alcançando máxima aos R$ 5,5564, mas logo perdeu fôlego, em sintonia com a baixa do índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente à cesta de seis divisas fortes -, na esteira de dados da economia americana que chancelam uma postura não tão incisiva por parte do Federal Reserve, o banco central norte-americano.
O índice de preços ao produtor (PPI) nos EUA em dezembro subiu 0,2%, abaixo do previsto (0,4%). Já os pedidos semanais de seguro desemprego avançaram a 230 mil, acima das expectativas (200 mil). Declarações de dirigentes do BC norte-americano ao longo do dia apenas ratificaram a aposta em alta de juros em março e não tiveram grande impacto na formação de preços.
Dados positivos do setor de serviços doméstico também teriam apoiado o real, ao pintar um quadro menos desolador para a atividade econômica. Segundo o IBGE, o volume de serviços prestados subiu 2,4% em novembro (com ajuste sazonal), acima da mediana do Projeções Broadcast (+0,1%).
Na mínima, registrada no fim da manhã, a moeda quase rompeu a linha de R$ 5,50, ao tocar em R$ 5,5013. Mas voltou a ganhar certo fôlego e passou à tarde operando entre a faixa de R$ 5,51 e R$ 5,52. Com diminuição do ritmo de perdas no fim da sessão, o dólar à vista encerrou em queda de 0,10%, a R$ 5,5295 – menor valor de fechamento desde 17 de novembro. Na semana, a divisa perde 1,81%.
“Com noticiário interno fraco, o dólar acompanhou muito o comportamento do índice DXY no mercado externo”, afirma o economista-chefe da Frente Corretora, Fabrizio Velloni, ressaltando que as leituras recentes de inflação nos EUA, embora ainda elevadas, vieram dentro das expectativas. “Isso tirou um pouco da necessidade de hedge e fez investidores olharem outras moedas. O dólar também já tinha subido muito em dezembro com as preocupações sobre o impacto da variante Ômicron.”
Em relação às divisas emergentes e de exportadores de commodities, a moeda americana teve um comportamento misto, embora tenha apresentado queda firme frente a pares do real, como os pesos mexicano e chileno. O dólar subiu mais de 2% em relação à lira turca e ao rublo – esse prejudicado pelo agravamento das tensões geopolíticas entre Estados Unidos e Rússia, que ameaça invadir a Ucrânia.
Para o operador Hideaki Iha, da Fair Corretora, um dólar na casa de R$ 5,50 não é sustentável, dados os problemas fiscais domésticos, a possibilidade de que o Fed seja mais agressivo e o fim do período sazonal de exportação de soja no primeiro trimestre. “Além de o Fed começar a subir juros, a corrida eleitoral vai esquentar a partir do segundo trimestre. Vejo o dólar para cima de R$ 5,60”, diz Iha, ressaltando que, se não fosse o ambiente externo, poderia haver estresse no mercado doméstico “com mais um sinal de perda de prestígio do ministro Paulo Guedes”.
Decreto publicado nesta quinta determina que atos relacionados à gestão do Orçamento público tenham aval prévio da Casa Civil, o que, segundo especialistas, mina o poder do ministro da Economia, Paulo Guedes, e “politiza” ainda mais o debate orçamentário. Segundo fontes ouvidas pelo Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), o Ministério da Economia minimizou a questão e disse que a medida vai ajudar a ala econômica a “dividir desgaste” provocado por eventuais cortes de recursos.
Guedes, relatam fontes, continua contrário ao reajuste dos servidores públicos. O ministro teria acenado a interlocutores, contudo, com a possibilidade de apoiar a aprovação do Refis para parcelamento de débitos tributários de médias e grandes empresas caso o Senado aprove a reforma do Imposto de Renda, que prevê taxação de lucros e dividendos com uma alíquota de 15%.