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No pós-Copom, dólar sobe 1,26% com risco fiscal no radar

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Estadão Conteúdos

Renovadas preocupações com a política fiscal, após o malogro na votação da PEC dos Precatórios pela Câmara dos Deputados, e a leitura predominante de que o Comitê de Política Monetária (Copom) não foi na quarta-feira duro o suficiente, tanto no grau de aperto monetário (1,50 ponto porcentual, para 7,75%) quanto em seu comunicado, levaram investidores a manter uma postura defensiva no mercado de câmbio doméstico nesta quinta-feira, 28.

Diante da incerteza sobre qual será, afinal, o desenho orçamentário para acomodar os precatórios e emplacar o Auxílio Brasil de R$ 400, avalia-se que a política monetária deve ser ainda mais restritiva para ancorar as expectativas de inflação e dar o mínimo de credibilidade à política econômica. Nem mesmo a divulgação de superávit de R$ 303 milhões do Governo Central em setembro, acima da mediana do Projeções Broadcast (déficit de R$ 4,250 bilhões), arrefeceu os temores de degringolada fiscal em meio ao abandono informal do teto de gastos. A fotografia das contas públicas pode ser boa, mas a história que o filme conta caminha para um final muito ruim, dizem analistas.

O dólar à vista já abriu a sessão em alta e ultrapassou a marca de R$ 5,60 na primeira hora de negócios. O pior momento veio no início da tarde, quando a moeda americana correu até a máxima de R$ 5,6358 (+1,45%), em meio a rumores de que, dadas dificuldades para a aprovação da PEC dos Precatórios, o governo estudaria a possibilidade de decretar estado de calamidade pública, abrindo espaço para despesas fora do teto de gastos e renovação do auxílio emergencial, por meio da aprovação de créditos extraordinários.

Logo em seguida, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-R), disse ao Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) que não vai haver prorrogação do auxílio emergencial e nem decretação do estado de calamidade porque a PEC dos Precatórios será aprovada na próxima quarta-feira, 3, em sessão presencial da Câmara. Na mesma linha, o ministro da Cidadania, João Roma, afirmou que o governo está focado “na aprovação da PEC” e não “há plano B”. Em entrevista para comentar o resultado das contas do Governo Central, o subsecretário de Planejamento Estratégico da Política Fiscal do ministério da Economia, David Rebelo Athayde, disse que “não tem possibilidade de a equipe econômica defender a ideia de que haja um novo decreto de calamidade pública”.

Depois da debandada de parte da equipe econômica na semana passada, puxada pela saída do secretário de Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, cresceram as dúvidas sobre a capacidade do ministro da Economia, Paulo Guedes, de se contrapor ao desejo da ala política do Planalto por ampliação das despesas.

Após orbitar ao redor de R$ 5,60 na maior parte da tarde, o dólar voltou a acelerar na última hora de negócios, em conjunto com a virada do Ibovespa para o campo negativo, e encerrou cotado a R$ 5,6253, em alta de 1,26% – o pior desempenho entre as divisas emergentes, em dia de perdas também para o peso mexicano e o rand sul-africano, tidos como pares do real. A moeda americana caiu, contudo, em relação a outras divisas de países exportadores de commodities e na comparação com seus pares fortes. Com o avanço nesta quinta-feira, as perdas do dólar na semana foram praticamente apagadas (-0,04%). No acumulado do mês, a moeda americana avança 3,29%.

Para o head de câmbio da Acqua-Vero Investimentos, Alexandre Netto, a tese de que uma taxa Selic maior daria sustentação ao real não se sustenta, uma vez que a curva de juros já embute bastante prêmio e, mesmo assim, o dólar segue em ascensão. “O problema é a percepção de risco elevada com essa incerteza sobre a política fiscal”, diz.

Netto avalia que, mesmo com a aprovação da PEC dos Precatórios, permanecerá a desconfiança sobre a âncora fiscal do País, já que o Congresso teria chancelado uma “manobra” para contornar o teto de gastos. Se a PEC não vingar, é quase certo que o governo arrumará um jeito de bancar o Auxílio Brasil, do qual Bolsonaro disse não abrir mão. “Com esse populismo fiscal, não vejo no curto prazo como o dólar possa recuar para abaixo dos R$ 5,50. Deve ficar numa faixa entre R$ 5,50 e R$ 5,70 no curto prazo”, afirma o head da Acqua-Vero, acrescentando que a volatilidade deve aumentar amanhã, dia da formação da última taxa Ptax de outubro.

A economista-chefe do Banco Ourinvest, Fernanda Consorte, vê a alta do dólar hoje, a despeito da elevação da Selic, como uma reação ao aumento do risco fiscal extrateto, após o adiamento da votação da PEC dos Precatórios e os rumores de extensão do auxílio emergencial. “Além disso, o IGP-M de outubro veio acima das expectativas. É mais um número de inflação assustando o mercado”, afirma Consorte, em referência a alta de 0,64% do IGP-M neste mês, acima do teto do Projeções Broadcast, de 0,61%.

No exterior, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a seis divisas fortes – operou em queda firme, na casa de 93,300, sobretudo por conta do fortalecimento do euro, na esteira de declarações mais duras da presidente do BCE, Christine Lagarde. Cresce a percepção de que os Bancos Centrais das economias desenvolvidas vão acelerar a normalização da política monetária, o que, é claro, respinga nas moedas emergentes.

O resultado abaixo do esperado da primeira leitura do PIB dos EUA no terceiro trimestre – crescimento de 2% ante projeção de 2,5% – ajudou a tirar um pouco de força do dólar ante divisas fortes, mas não alterou a expectativa para início da retirada de estímulos monetários pelo Federal Reserve a partir do mês que vem. O índice de preços de gastos com o consumo (PCE) subiu à taxa anualizada de 5,3% no terceiro trimestre, enquanto o núcleo (sem alimentos e energia) avançou 4,5%.