Na avaliação do advogado Luis Fernando Riskalla, especialista em Direito do Trabalho e sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados, os fundamentos citados para a edição da portaria contradizem o estabelecido por artigo da Constituição que garante aos empregados a segurança e saúde em suas atividades empregatícias. “Questiona-se: como poderão os empregadores, além das ações que já lhes competem, garantir a saúde e integridade de seus empregados se não podem, ao menos, ter o controle de quem está, de fato, imunizado?”
O advogado Donne Pisco, sócio fundador do Pisco & Rodrigues Advogados, aponta outra inconstitucionalidade da portaria, indicando que ela infringe artigo da Constituição Federal de indica que a ‘competência do ministro de Estado se limita a instrumentalizar o cumprimento das leis de sua alçada, não podendo, criar normas em usurpação da competência do Poder Legislativo’.
“O ato normativo do Ministério do Trabalho e Emprego não tem o efeito de vincular a livre apreciação do tema pelos juízes: a restrição imposta, que busca impedir a demissão por justa causa de pessoas que se recusem à vacinação, não tem fundamento legal – inclusive, porque a resistência imotivada à imunização atenta contra o esforço coletivo para a contenção da pandemia, pondo em risco a saúde da população”, explica.
A mesma avaliação é feita pelo advogado Matheus Gonçalves Amorim, sócio do SGMP Advogados, que indica que a portaria do governo Bolsonaro vai de encontro com artigo da Constituição que garante aos trabalhadores a redução dos riscos ocupacionais por meio de normas de saúde, higiene e segurança e, ainda porque trata de matéria que a Constituição reservou a Lei. Amorim ainda lembra que alguns órgãos públicos exigem o comprovante de vacinação para que qualquer pessoa possa ingressar nas suas instalações. Nessa linha, considerando que há empresas que prestam serviços no mesmo local, a própria execução dos contratos se tornaria ‘impossível’, diz o advogado.
Por outro lado, Amorim destaca ainda que as portarias publicadas pelo Ministério do Trabalho, ‘tem efeito vinculante, em tese, apenas para o Poder Executivo, não vinculando a atuação da Justiça do Trabalho, quem tem apresentado posicionamento bastante distinto”.
O advogado lembra ainda que o Supremo Tribunal Federal já assentou que a vacinação obrigatória é constitucional, inclusive firmando tese sobre a possibilidade de imposição de medidas indiretas para sua efetivação, como por exemplo, a restrição ao exercício de determinadas atividades – “o que vai na contramão do que restou definido na Portaria”, indica Amorim.
Na mesma linha, Carlos Eduardo Dantas Costa, especialista em Direito do Trabalho e sócio do Peixoto & Cury Advogados, lembra que a portaria vai não só na contramão das decisões judiciais, mas também do Ministério Público do Trabalho”. Entendimento firmado em fevereiro pela Procuradoria vai no sentido de que trabalhadores que se recusarem a tomar a vacina contra a covid-19 sem apresentarem razões médicas documentadas poderão ser demitidos por justa causa. A mera recusa individual e injustificada à imunização não poderá colocar em risco a saúde dos demais empregados, avalia o MPT.
Sob uma outra perspectiva, a advogada Mariana Machado Pedroso, especialista em Direito do Trabalho e sócia do escritório Chenut Oliveira Santiago Advogados, avalia que a portaria pode ‘gerar uma movimentação que ainda não se tinha visto no Congresso Nacional a favor da regulação sobre a vacinação’. “Pela hierarquia das normas no Direito brasileiro, eventual lei estará hierarquicamente acima da portaria ministerial”, diz.
A advogada diz ainda que ‘certamente’ a portaria será questionada na Justiça, ‘quando serão avaliados os requisitos formais e limites possíveis de regulação de tal matéria por ato normativo do Executivo’. “A Justiça poderá invalidá-la ou, ainda, estando regular, declarar tal norma válida”, indica.