Selic, CDI, inflação, rentabilidade real, riscos ocultos e oportunidades despercebidas.
Você já se perguntou por que certos investimentos explodem enquanto outros fracassam, mesmo em tempos de alta dos juros? Ou por que o seu CDB de “ótima taxa” pode não ser tão bom assim?
Neste guia completo, você vai entender como juros e inflação se relacionam, quais indicadores realmente importam para tomar decisões conscientes, e como proteger e multiplicar seu patrimônio em cenários desafiadores.
Ao longo do artigo, você encontrará respostas claras, tabelas-resumo, comparações práticas e alertas sobre riscos pouco comentados. Tudo isso com uma linguagem acessível, sem perder a profundidade que o tema exige.
Prepare um café, porque esse conteúdo vai te dar muito mais do que informação: vai te dar vantagem.
1 – A RELAÇÃO ENTRE JUROS E INFLAÇÃO
Embora o Brasil tenha feito progressos no acesso aos investimentos, apenas uma pequena parcela da população brasileira investe ativamente, com muitos optando pela poupança, que oferece retornos inferiores. Entre os principais desafios está a complexidade dos conceitos financeiros e o desconhecimento de termos fundamentais, como inflação, CDI e Selic.
Com certeza você escuta eles no noticiários a nas redes sociais, mas será que você realmente entende como eles se relacionam e influenciam um ao outro?
Este reels resume esses conceitos e as oportunidades que vamos explorar neste artigo, no qual vamos simplificar essa sopa de letrinhas e mostrar como uma boa estratégia de diversificação pode ajudar a maximizar retornos e proteger o poder de compra no longo prazo.
Vamos começar por aquele que provavelmente causa mais preocupação: a inflação. Por que se fala tanto dela? E por que é tão perigosa?
1.1 – O que é inflação
Essa é, basicamente, o aumento generalizado dos preços de produtos e serviços ao longo do tempo. Para quem está fazendo compras no supermercado, isso se reflete no seguinte: se o preço do arroz era R$ 20,00 há pouco tempo e agora está custando R$ 25,00, a inflação fez com que você precisasse de mais dinheiro para conseguir o mesmo produto. Embora seja uma forma de ver, é muito comum associarmos a inflação apenas ao aumento de preços, mas o ponto central é que ela diminui o poder de compra do seu dinheiro — com a mesma quantia, você compra menos. Ou seja, o seu dinheiro vale menos e não, necessariamente, que apenas os preços subiram.
1.2 – Por que existe inflação
E por que isso acontece? Existem várias razões. Uma delas é quando há muita demanda por produtos e serviços (muitas pessoas querendo a mesma coisa), mas a oferta (quantidade disponível) não acompanha. A demanda (vontade, impulso, necessidade, urgência) cresce muito mais rápido que a capacidade de produção. Em decorrência disso, muitas pessoas tendem a pensar que os preços sobem por ganância dos vendedores, mas, acredito que, o fator mais determinante nesse caso é a competição entre consumidores: quem deseja mais ou precisa mais está disposto a pagar mais. Isso leva à desvalorização do dinheiro, pois gasta-se mais para adquirir o mesmo bem.
Outro motivo é o aumento dos custos de produção. Quando o preço do petróleo sobe, por exemplo, o custo do transporte aumenta, e isso encarece os produtos nas prateleiras.
Além desses fatores, existe o que considero o mais comum atualmente, e o mais catastrófico: o governo de um país literalmente imprimindo mais e mais dinheiro. Esse fenômeno geralmente vem acompanhado de ignorância econômica e questões políticas e sociais complexas.
É importante destacar que esses fatores não acontecem isoladamente, mas simultaneamente, intensificando ainda mais a pressão inflacionária.
O poder mais destruidor desse monstro chamado inflação é o seu efeito contagioso, que se espalha de forma avassaladora e extremamente rápida, sendo desastroso para a economia global.
1.3 – O efeito contagioso da inflação
Suponha que o preço do trigo suba devido a uma colheita fraca. Esse aumento no preço do trigo rapidamente impacta os fabricantes de alimentos, que passam a gastar mais para produzir seus produtos. Diante desse cenário, optam por repassar esses aumentos aos consumidores, elevando o preço final dos produtos nas prateleiras.
Agora, pense em como esse aumento afeta o consumidor comum. Se o pão, um item básico no orçamento de muitas famílias, fica mais caro, as pessoas precisam gastar mais para comprá-lo. Isso faz com que elas reduzam o consumo de outros itens, como frutas, verduras ou até mesmo produtos não essenciais. Com essa mudança de comportamento, a demanda por esses outros itens também cai, levando produtores de frutas e vegetais, por exemplo, a ajustar seus preços para compensar a queda nas vendas.
Ao mesmo tempo, o aumento do preço do trigo afeta a cadeia logística. O transporte de alimentos, que já é sensível a variações nos custos de combustível, também fica mais caro. Caminhões, trens e navios que transportam esses produtos precisam gastar mais em combustíveis, o que encarece ainda mais o preço dos alimentos e de outros produtos que dependem desse sistema logístico.
Esse aumento nos custos de transporte, por sua vez, não afeta apenas o setor de alimentos. Outros segmentos, como o de vestuário, eletrônicos e até produtos importados, também são impactados, já que os custos de transporte fazem parte do preço final de qualquer mercadoria. Assim, o aumento no preço de um item tão específico quanto o trigo pode se espalhar por toda a economia, elevando o custo de vida em geral e diminuindo o poder de compra das pessoas.
Esse fenômeno ilustra como um aumento de preços em um micro setor pode rapidamente se espalhar por diversos outros setores, resultando em inflação generalizada. O que começa com um aumento de custos em um único setor pode acabar afetando a economia de todo o país, e em um mundo globalizado, esse efeito pode até atravessar fronteiras, impactando o comércio e a economia internacional.
Continua com dificuldade de visualizar? Veja este reels. Na simplicidade de um toque de exagero e uma pitada de humor, é possível visualizar e entender o princípio que estamos discutindo.
1.4 – Formas de controlar inflação
Países, instituições, empresas e estudiosos ao redor do mundo tentam há séculos entender como controlar a inflação. As soluções não são consenso, como podemos ver na diversidade de correntes de pensamento, modelos de governo mais ou menos intervencionistas etc. Não vou entrar no mérito dessa questão aqui, mas fato é que no Brasil há um regime de meta de Inflação em vigor desde 1999. Segundo o Banco Central do Brasil, inflação baixa, estável e previsível traz vários benefícios para a sociedade. A economia pode crescer mais, pois a incerteza na economia é menor, as pessoas podem planejar melhor seu futuro e as famílias não têm sua renda real corroída.
1.5 – Como é feito no Brasil
A meta de inflação é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e cabe ao Banco Central (BC) adotar as medidas necessárias para alcançá-la. Atualmente a meta de inflação do Brasil é 3,00% e o intervalo de tolerância (também definido pelo CMN) é de mais ou menos 1,50 ponto percentual, isto é, ela pode ficar entre 1,50% e 4,50% ao ano. A principal ferramenta do BC para alcançar essa meta é a famosa Taxa Selic, a taxa básica de juros da economia brasileira.
1.6 – Juros
Juros nada mais são do que o custo do dinheiro. Quando as taxas de juros estão altas, é caro pegar dinheiro emprestado. Quando estão baixas, é mais barato.
E por que isso importa? Bem, porque praticamente todo empreendedor precisa pegar dinheiro emprestado para se financiar e ter sucesso. E são os empreendedores que geram empregos, as pessoas recebem seus salários, compram o que precisam e desejam, a economia gira e a vida segue.
1.7 – O impacto dos juros na economia
Consegue perceber como as coisas se entrelaçam? Se as taxas de juros estão baixas, o apetite dos empreendedores e investidores é estimulado, e eles começam a tirar seus sonhos do papel — abrir uma loja, uma gráfica ou uma padaria, por exemplo — porque conseguem obter crédito saudável para isso.
Imagine qualquer pessoa calculando os custos para construir instalações, comprar matéria prima, contratar funcionários, pagar impostos etc. É um processo cheio de dúvidas, com uma avaliação cuidadosa sobre se realmente vale a pena todo o esforço e risco envolvidos. No entanto, um fator que pode animar e dar confiança ao empreendedor são as taxas de juros baixas. Com essa perspectiva, ele acredita que, ao prosperar, conseguirá honrar suas dívidas e alcançar sucesso e lucro.
Por outro lado, se as taxas de juros estão altas, os empreendedores pensam duas vezes antes de iniciar ou expandir um negócio, pois o custo das dívidas se torna proibitivo, dificultando ainda mais o que já é uma missão quase homérica no Brasil. Assim, acabam adiando seus projetos, esperando um momento mais oportuno.
1.8 – Como a taxa de juros é utilizada para controlar a inflação
É desse ciclo de estímulo e desestímulo que o BC se vale para controlar a inflação. Vimos pelo ponto de vista do empreendedor, mas o mesmo vale para todos os consumidores. Quando os juros sobem, fica mais caro para os consumidores financiarem suas compras (já que a maioria delas são parceladas e, parcelas incluem juros), o que diminui a atividade econômica, freando a demanda e, eventualmente, controlando a inflação.
Se a economia está estagnada, os juros são reduzidos para incentivar o consumo e o investimento. O dinheiro mais barato motiva tanto os empreendedores a realizar seus projetos quanto os consumidores a fazer grandes compras.
É evidente que essa análise foi exagerada e simplificada, para o movimento ficar mais nítido. À medida que fatores como crises políticas, sociais, de saúde e internacionais são incluídos, a análise se torna mais complexa e mais difícil fica identificar qual nuance ou relação entre eles está influenciando mais.
Dito isso, uma coisa é certa: desde que o mundo é mundo, esse ciclo se repete constantemente. Embora nunca em períodos iguais, ele sempre ocorre. Sabendo disso, podemos nos preparar melhor para ele, e esse é o propósito deste artigo.
2 – INDICADORES E O MERCADO
Os investimentos em renda fixa, de modo geral, são favorecidos quando as taxas de juros estão altas. É nesse momento que duas palavras aparecem com frequência: Selic e CDI. Elas representam dois indicadores diferentes, embora muitos os confundam.
2.1 – Selic
A Selic é definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom), um órgão do Banco Central do Brasil. O Copom se reúne a cada 45 dias para avaliar a economia e definir a meta da Taxa Selic com base em indicadores como inflação, crescimento econômico, cenário internacional e outros fatores. Essa é Taxa Selic Meta, que tem o objetivo de controlar a inflação e estimular ou desacelerar a economia.
No entanto, a Selic Meta ainda não é o que remunera os investimentos. Quem faz isso é a Taxa Selic Over, que se refere à taxa real utilizada nas transações de compra e venda de títulos públicos entre o BC e instituições financeiras, ficando sempre muito próxima da Selic Meta, uma vez que o Banco Central atua para que isso aconteça.
2.2 – CDI
O CDI, por sua vez, refere-se às operações realizadas entre bancos. Assim como em um CDB, onde você empresta dinheiro para o banco, o CDI é um banco emprestando dinheiro para outro. As operações de CDI (Certificado de Depósito Interbancário) ocorrem porque, diariamente, as instituições financeiras precisam manter um saldo mínimo de caixa, determinado pelo Banco Central, para garantir que tenham liquidez suficiente para honrar seus compromissos (como saques e transferências) e manter a estabilidade financeira.
Como o fluxo de dinheiro em um banco pode variar de um dia para o outro, muitas vezes uma instituição pode fechar o dia com um saldo maior do que o necessário, enquanto outra pode ficar com saldo insuficiente. Para equilibrar essa situação, os bancos emprestam dinheiro entre si. Nos empréstimos realizados entre os bancos por meio de CDIs há cobrança de juros. As operações são registradas na B3, que calcula a taxa média de juros praticada nos certificados interbancários de todo o mercado financeiro. Essa taxa, divulgada diariamente, é conhecida como “taxa DI”, que também é chamada “taxa do CDI”.
Vale lembrar que, quando você escuta CDI, geralmente as pessoas estão se referindo à taxa do CDI ou à taxa DI.
2.3 – Na prática
O que você precisa no dia a dia pode ser resumido da seguinte forma: considere a Selic Over e o CDI iguais (são diferentes, mas sempre muito próximos) e ambos ficando praticamente sempre 0,1% abaixo da Selic Meta, como na tabela abaixo:
Isso é uma aproximação, mas funciona bastante no cotidiano.
2.4 – Investimentos beneficiados com a alta da Selic e o CDI
É de conhecimento comum que a renda fixa é muito beneficiada pela alta da taxa Selic, e consequentemente do CDI. Para começar a lista de investimentos beneficiados, um exemplo clássico é o Tesouro Selic, um título público federal que remunera o investidor conforme a variação dessa taxa. Se a Selic sobe, a rentabilidade do Tesouro Selic também aumenta, proporcionando maiores retornos para as reservas de emergência e liquidez dos investidores, que são as aplicações mais recomendadas para esses títulos.
Além do Tesouro Selic, uma gama de títulos de renda fixa é beneficiada pela alta da taxa de juros. CDBs, LCIs, LCAs, debêntures, CRIs e CRAs são exemplos de títulos que geralmente têm sua rentabilidade atrelada ao CDI. É nesse momento que muitas pessoas ficam confusas ao ver expressões como “100% do CDI”, “110% do CDI”, “200% do CDI”, sem entender o que isso significa e se é bom ou ruim.
2.5 – Rentabilidade do CDI
Interpretar a porcentagem em si não é muito difícil, e já vou te mostrar como fazer isso. No entanto, entender se é bom ou ruim, se é muito ou pouco, é algo bem mais complexo, pois envolve o horizonte de tempo que você pode deixar o dinheiro aplicado, perfil de investidor e riscos envolvidos. Aqui, não recomendo de forma alguma que você faça essa análise sozinho, especialmente por conta da análise do risco do emissor. Em ativos como debêntures, CRIs e CRAs, há o risco real de perder todo o capital investido caso o emissor enfrente problemas de pagamento ou venha a falir.
Falando da porcentagem, quando você vê um CDB, por exemplo, oferecendo 110% do CDI, isso significa que o título pagará uma rentabilidade equivalente a 110% da taxa do CDI (ou taxa DI). Pensando na aproximação que discutimos anteriormente, se a Selic atualmente está em 14,25% ao ano, podemos estimar que o CDI está em 14,15% ao ano. Assim, um CDB que pague 110% do CDI renderá cerca de 15,6% ao ano (14,15% * 1,10).
2.6 – Comparando investimentos indexados ao CDI
Quando as pessoas entendem como interpretar as porcentagens do CDI, é natural que busquem as maiores taxas possíveis. No entanto, isso pode levar a alguns erros de análise. Por exemplo, imagine que um investidor está procurando uma opção de investimento para 1 ano de prazo e encontra duas opções:
- A) um CDB pagando 110% do CDI
- B) uma LCI pagando 95% do CDI
Qual deles rende mais? Muitas pessoas compararam apenas o número nominal e presumem que, por 110 ser maior que 95, o CDB rende mais. No entanto, a LCI é um investimento isento de imposto de renda e isso muda completamente o cenário.
Na realidade, essa LCI de 95% do CDI rende mais que o CDB de 110% do CDI. Mas como fazer essa análise? Existe uma técnica para comparar a rentabilidade ativos isentos ou não de imposto de renda, chamada gross- up. O gross-up consiste em “embutir” artificialmente o imposto em um ativo isento, para estimar qual seria a rentabilidade dele caso houvesse tributação. Assim, você consegue comparar com outros ativos tributáveis (banana com banana) e escolher a melhor opção.
2.7 – Tributação de investimentos de renda fixa
Para aplicar o gross-up, primeiro precisamos entender a tributação dessas opções de investimentos, resumidas na tabela abaixo.
Outro ponto importante é a alíquota de imposto que incidirá sobre os investimentos tributáveis, conforme a tabela regressiva do imposto de renda, detalhada abaixo.
2.8 – Gross-up
Como mencionado, ao aplicar essa alíquota “fictícia”, é possível evitar distorções, uma vez que o imposto de renda reduz a rentabilidade dos investimentos. Em muitos casos, um ativo financeiro isento de imposto, mesmo com um retorno aparentemente menor, pode oferecer ganhos mais altos do que um produto tributado. Para calcular corretamente o gross-up de um investimento, utilize a fórmula:
Rendimento bruto = rendimento líquido / (1 – IR)
Vamos aplicar a fórmula no exemplo da LCI de 95% do CDI e o CDB de 110%. Como a LCI é isenta de IR, a fórmula permite calcular qual seria o rendimento “bruto” caso houvesse imposto, possibilitando uma comparação direta com o CDB. Supondo que ambos tenham vencimento em até um ano, a alíquota aplicável seria de 20%, e o cálculo ficaria assim:
Rendimento bruto = 0,95 / (1 – 0,2)
Rendimento bruto = 0,95 / 0,80
Rendimento bruto = 1,188
Portanto, a LCI de 95% do CDI, ao ser ajustada pela técnica do gross-up, teria um rendimento de aproximadamente 118,8% do CDI (1,188 * 100), o que a torna mais atrativa que o CDB de 110% do CDI.
2.9.1 – Não é só sobre rentabilidade: cuidado com o risco do emissor
Esse ponto merece muito destaque e, por isso, a repetição!
Como dito, é comum ver muitos investidores focados apenas em buscar as maiores taxas possíveis, acreditando que quanto maior a rentabilidade, maior o retorno. No entanto, é igualmente importante avaliar o risco do emissor.
Em termos de títulos de renda fixa, aqueles com rentabilidades mais elevadas geralmente são oferecidos por emissores com menor rating. Se você está investindo em um emissor com um ótimo rating, é natural que a remuneração seja menor. Pense que o Itaú, por exemplo, não tem motivo para pagar a mesma taxa que um pequeno banco estadual da região Nordeste. O Itaú possui mais nome, credibilidade e segurança, então o banco menor precisará oferecer uma rentabilidade bem maior para que você considere investir nele.
Pense que se você está sempre pegando as maiores taxas possíveis, pode ser que esteja sempre investindo nos emissores com os maiores riscos de crédito do mercado. Em algum momento, algum deles pode te dar um grande prejuízo e você perder todo o rendimento que acumulou ao longo dos anos de uma única vez. Pense que se todo dia você joga uma pedra para cima, pode ser que um dia ela caia na sua cabeça, certo?
2.9.2 – Não é só sobre rentabilidade: cuidado com as trocas constantes e os movimentos atrasados
Outro ponto importante é a atenção às oscilações de alta e queda da taxa de juros e como muitos investidores ficam migrando com frequência entre as classes de ativos, acompanhando esse movimento, buscando o que oferece o maior retorno no momento. Anteriormente, vimos diversos ativos que pagam bem enquanto a Selic está alta. Quando a Selic cai, muitos investidores correm para vender esses ativos e migrar para a bolsa, pois, neste cenário, a única forma de aumentar o retorno é assumindo mais risco. Quando a Selic volta a subir, o movimento se inverte: todos saem da bolsa para retornar à renda fixa.
O problema é que a maioria age após a mudança ter ocorrido e a nova realidade já tenha sido precificada, o que pode levar a perdas recorrentes. Para ganhar dinheiro, é essencial entender o ciclo e se posicionar antecipadamente, seguindo uma estratégia sólida de diversificação de carteira. Assim, quando as oscilações acontecem e a carteira naturalmente se desbalanceia, você pode aproveitar para comprar boas oportunidades — aquilo que estiver mais barato no momento — aumentando o retorno a longo prazo.
Para simplificar, imagine que você adote uma estratégia de 50% em renda fixa pós-fixada e 50% em bolsa, incluindo ações e fundos imobiliários. Agora, suponha que a taxa Selic tenha subido consideravelmente recentemente. Provavelmente, a parcela de renda fixa pós-fixada da sua carteira se valorizou bastante, enquanto a bolsa caiu. Nesse cenário, a renda fixa passa a representar 75% da sua carteira, enquanto a bolsa representa apenas 25%, desbalanceando a estratégia.
Nesse momento, o investidor comum ficará com medo da bolsa ao ver os números negativos e a insegurança pairando no ar, enquanto o mercado segue extremamente otimista com a renda fixa, mesmo que esses títulos estejam todos muito valorizados e caros (lembra da conversa inicial? A alta demanda fará com que seus preços subam consideravelmente). É nessa hora que você deve ser anticíclico e comprar o que está barato: a bolsa. Investir naquilo que ninguém acredita, que todos temem, e seguir comprando até que a bolsa volte a representar 50% da sua carteira, conforme a sua estratégia.
Se você conseguir fazer isso, é esperado que, quando o cenário se inverter e a bolsa se valorizar, o impacto positivo na sua carteira será significativo. Além da valorização, você ainda terá o ganho extra de ter comprado os ativos a preços descontados. Nesse momento, o efeito da demanda funcionará da mesma forma: o otimismo e a euforia que antes eram direcionados à renda fixa agora serão direcionados à renda variável, e muitas empresas serão negociadas a múltiplos altíssimos, muitas vezes irracionais. Assim, você fará o inverso: poderá tanto vender parte da parcela de bolsa para realizar os lucros, direcionando o capital, junto com novos aportes, para onde ninguém está olhando: a renda fixa, onde os preços estarão mais baixos e pouco valorizados no momento, até que você restabeleça o balanceamento da estratégia em 50/50.
3 – IMPACTO DA INFLAÇÃO NOS INVESTIMENTOS
A inflação, por sua vez, corrói o poder de compra do dinheiro ao longo do tempo. Quando falamos de investimentos atrelados à inflação, estamos nos referindo a ativos que protegem o capital da desvalorização causada por ela. Eles são especialmente importantes em países com histórico de inflação descontrolada, como é o caso do Brasil.
Essa classe de ativos é crucial independentemente de a Selic estar alta ou baixa. É fundamental manter sempre uma parte do patrimônio indexado à inflação, pois de nada adianta obter uma rentabilidade interessante nos seus investimentos se a inflação cresce em ritmo semelhante, ou no pior dos cenários, de forma ainda mais rápida e expressiva.
Na Valor Investimentos, para uma carteira diversificada e balanceada, recomendamos:
- Conservadores: entre 7,5 e 12,5% do patrimônio líquido
- Moderados: 10 a 15%
- Agressivos: 15 a 20%
3.1 Rentabilidade dos títulos indexados à inflação
Geralmente, os títulos de inflação têm uma remuneração híbrida, ou seja, combinam uma parte da rentabilidade indexada à inflação (IPCA) com uma taxa fixa. Por exemplo, um título IPCA + 6% oferece ao investidor a variação do IPCA no período mais uma taxa fixa de 6%.
Fazendo uma aproximação grosseira, se a inflação no período for de 4%, o rendimento total será IPCA (4%) + 6%, resultando em 10% de rentabilidade nominal. Se a inflação for de 2%, o rendimento será de 2% + 6% = 8%. A grande vantagem desse tipo de investimento é que, independentemente de como a inflação se comporta, você sempre terá uma rentabilidade real garantida (neste caso, os 6%).
Essa estrutura híbrida é o que oferece a chamada proteção contra a inflação, pois enquanto outros investimentos podem perder valor com o aumento da inflação, os indexados ao IPCA ajustam-se automaticamente, garantindo que o seu dinheiro mantenha seu poder de compra ao longo do tempo. Em cenários de alta inflação, isso pode ser crucial para preservar o valor do seu capital.
Para outras classes de ativos, é necessário fazer o cálculo da rentabilidade real. Por exemplo, se você vê um investimento rendendo 15% ao ano, pode parecer uma ótima rentabilidade à primeira vista. No entanto, isso depende da inflação no período. Se a inflação do ano foi de 9%, a rentabilidade real do seu investimento foi de apenas 6% (veja como fazer o cálculo exato na próxima seção).
Se você acha que essa estimativa de inflação é exagerada, observe o gráfico abaixo com o histórico de inflação no Brasil. Em maio de 2003, a inflação anualizada chegou a incríveis 17,24%, e, mais recentemente, em abril de 2022, alcançou 12,13%. Imagine que você possui um título de IPCA + 10% (como os disponíveis em alguns títulos de crédito privado). Com uma inflação de 12,13% ao ano, seu lucro nominal seria impressionantes 22,1% ao ano.
Gostou desse efeito de proteção? Ele é, de fato, incrível! É por isso que existe uma vertente de investidores que preferem avaliar a rentabilidade de suas carteiras com base na inflação, em vez do CDI, como é mais comum. Esse é um tema que vale aprofundar, e vamos discutir mais sobre isso em um próximo artigo.
3.2 Rentabilidade real de investimentos
Para descontar o efeito corrosivo da inflação e calcular a rentabilidade real dos seus investimentos, basta utilizar a equação abaixo:
No exemplo da seção anterior, em que a rentabilidade nominal é de 15% e inflação é de 9%, o cálculo seria o seguinte:
Assim, obtemos uma rentabilidade real de aproximadamente 5,41%.
3.3 Títulos públicos indexados a inflação nas máximas históricas
Se você deseja começar a investir indexando uma parte do portfólio à inflação, uma ótima alternativa é começar com um título público, já que, nacionalmente, são os mais seguros possíveis.
A NTN-B, ou Tesouro IPCA+ com juros semestrais, é um título público emitido pelo Tesouro Nacional que paga a variação da inflação, garantindo o poder de compra do seu dinheiro, mais uma taxa fixa. Esse ativo para 2035 paga hoje IPCA + 7,55%.
Olhando em um histórico longo de mais de 10 anos, poucos foram os momentos em que as taxas de algumas NTN-Bs de vencimentos curtos e intermediários (2028, 2030 e 2035) estiveram acima de IPCA+6,5%.
Fonte: XP Investimentos
Se olharmos nesse período como foi o desempenho dos títulos públicos atrelados ao IPCA, com características semelhantes a NTN-B 2035, veremos que na maior parte do tempo ficou acima de 100% do CDI (área preenchida em amarelo do gráfico abaixo), com destaque para o período após 2016, no qual a rentabilidade acumulada chegou a bater mais de 300% do CDI. De qualquer forma, durante esses 12 anos, o retorno médio dessa cesta de títulos IPCA+ foi de 135,6% do CDI para quem carregou essa posição no período.
Fonte: XP Investimentos
O principal risco dessa aplicação é o de liquidez, já que os prazos geralmente ficam acima de 10 anos. No entanto, ao realizar uma boa compra — como agora, com taxas super atrativas — há a possibilidade de obter uma saída vantajosa no mercado secundário, com ágil (ganho adicional) ao se desfazer do título antecipadamente.
Neste vídeo, postado no Instagram da Valor Investimentos, explico um pouco mais sobre esse ativo indispensável para qualquer investidor que pensa a longo prazo e deseja proteger o poder de compra do seu capital.
3.4 – Outros investimentos indexados à inflação
Além dos títulos públicos indexados à inflação, há alternativas que podem oferecer rentabilidades ainda maiores, embora envolva um nível de risco mais elevado. Um exemplo são os ativos de crédito privado indexados ao IPCA, como debêntures incentivadas, CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) e CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio). Esses ativos são emitidos por empresas e setores específicos e oferecem a vantagem de rentabilidade atrativa, mas, em contrapartida, apresentam riscos maiores do que os títulos públicos.
O risco nesses investimentos está principalmente ligado à capacidade de pagamento do emissor. Quanto maior a possibilidade de um emissor passar por dificuldades financeiras, maior o risco de inadimplência, o que afeta diretamente a segurança do investimento. Portanto, é essencial adotar uma estratégia de diversificação e balanceamento para evitar exposição excessiva a um único emissor ou setor, especialmente em ativos de crédito privado.
3.5 – Limites de exposição a crédito privado
Na Valor Investimentos, independentemente do perfil de risco do investidor, recomendamos limitar a exposição máxima a 2% do patrimônio líquido (PL) em cada emissor (há casos em que até 1%), mesmo que sejam emissores high grade, com ratings elevados. Essa prática ajuda a reduzir riscos e a proteger o capital investido, permitindo que o investidor aproveite o potencial de retorno dos ativos de crédito privado de forma equilibrada e segura.
High grade refere-se a empresas com boas avaliações de risco, ou seja, com notas de crédito (ratings) elevadas. Essas notas são atribuídas por agências classificadoras de risco, como Moody’s, S&P Global Ratings e Fitch Ratings e refletem a capacidade da empresa de honrar suas obrigações financeiras. Quanto maior o rating, teoricamente, menor a probabilidade de a empresa enfrentar dificuldades financeiras e, assim, dar um calote em seus investidores.
Entretanto, é fundamental lembrar que mesmo emissores high grade possuem algum grau de risco, e por isso, a exposição deve ser cuidadosa e moderada. Da mesma forma que quando você vai comprar uma ação, é necessário avaliar não somente os números e indicadores daquela empresa em específico, mas o setor há qual está inserida, o momento de mercado desse setor no país e no restante do mundo, avaliar os setores concorrentes e, sobretudo, fazer a diversificação setorial e de ativos dentro da carteira.
3.6 – Tabela resumo: emissor, tributação e risco
Abaixo, confira a tabela resumo dos possíveis investimentos indexados à inflação.
3.7 – Comparando rentabilidade de ativos isentos e não isentos
Ainda sobre os ativos de crédito privado, um ponto que os torna especialmente atraentes — neste caso, especificamente CRIs, CRAs e debêntures incentivadas — é a isenção do Imposto de Renda (IR) para pessoas físicas. Essa vantagem fiscal eleva significativamente a rentabilidade desses papéis em comparação aos ativos tributáveis, já que o retorno bruto nos ativos isentos é aproveitado integralmente pelo investidor. Confira o impacto dessa vantagem na tabela comparativa abaixo.
O gross-up para os títulos de inflação, de forma aproximada, pode ser realizado seguindo a metodologia apresentada anteriormente para os ativos indexados ao CDI.
Explorar as nuances da inflação, dos juros e dos investimentos atrelados a esses indicadores nos mostra a importância de conhecer as diversas ferramentas disponíveis para proteger e potencializar nosso capital. Em países com histórico de inflação instável, como o Brasil, o planejamento financeiro e a proteção do patrimônio contra a desvalorização monetária são essenciais para garantir o poder de compra no longo prazo.
Os títulos de inflação oferecem uma camada de segurança para o investidor que deseja mitigar os efeitos corrosivos desse mal em sua carteira. Além disso, entender como a isenção de impostos pode influenciar a rentabilidade líquida desses investimentos é fundamental para tomar decisões mais informadas e vantajosas.
Por fim, a escolha de ativos deve ir além da busca por altas rentabilidades. A análise do risco do emissor, a diversificação setorial e a alocação estratégica — considerando ciclos de alta e baixa de juros — são essenciais para que você construa uma carteira sólida, equilibrada e preparada para diferentes cenários econômicos.
Para um planejamento realmente eficaz, lembre-se de que a orientação de um assessor de investimentos é essencial, ajudando você a adaptar suas estratégias ao seu perfil e objetivos financeiros. Estar atento a esses detalhes faz toda a diferença no longo prazo e permite que você não apenas proteja seu patrimônio, mas também amplie as oportunidades de crescimento com segurança.