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Você sabe tomar decisão?

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Uma das características comum à espécie humana é indagar sobre o seu futuro, na tentativa de controlá-lo. No entanto, há um paradoxo nisso. Sabemos também que o futuro é incerto. Racionalizá-lo e dominá-lo parece estar além dos nossos domínios. Este paradoxo gera um efeito que nos faz refletir sobre como mitigar os riscos futuros. Quando se trata do mundo dos investimentos, isso faz total diferença no momento em que se toma alguma decisão. Você sabe tomar decisão?

Step by step. Dois psicólogos cognitivos, Amos Tversky e Daniel Kahneman, conseguiram demonstrar frequentes violações dos pressupostos da racionalidade no momento da decisão. Inicialmente, eles notaram que os humanos utilizavam regras heurísticas para tomar decisões, ou seja, regras heurísticas nada mais são d que atalhos mentais ou regras empíricas para encontrar uma solução para um dado problema.

A utilização de regras heurísticas pode gerar vieses nas decisões. Um viés de decisão é uma tendência sistemática de violar os axiomas da racionalidade ampla. Um fato importante é que o viés pode igualmente afetar de forma semelhante um grande número de pessoas.

Um segundo fator gerador de vieses de decisão foi agrupado sob o nome de teoria do prospecto ou das perspectivas (prospect theory).  Segundo a teoria da utilidade esperada, as pessoas são avessas ao risco. Porém Tversky e Kahneman, através de estudos controlados, demostraram que avaliamos probabilidade de ganhos ou perdas de forma assimétrica.

As pessoas tomam decisões com base no ganho ou perda potencial em relação à sua situação específica (o ponto de referência) e não em termos absolutos. Isso é conhecido como dependência de referência. Diante de uma escolha arriscada que leva a ganhos, os indivíduos são avessos ao risco, o que está de acordo com a teoria da utilidade esperada.

No entanto, diante de uma escolha arriscada que leva a perdas, os indivíduos buscam o risco, preferindo soluções que levem a uma utilidade esperada menor, desde que tenha potencial para evitar perdas. Essa demonstração robusta de violação da teoria da utilidade esperada foi a responsável pelo prêmio Nobel de Economia atribuído a Kahneman, pois na época Tversky já havia falecido.

Como a existência de erros sistemáticos no mercado financeiro não é compatível com as finanças modernas, surgiram as finanças comportamentais. Nessa corrente, busca-se considerar a forma real como os agentes econômicos tomam decisões.

Pensar no amanhã e saber dimensionar suas decisões podem não ser algo que se faça naturalmente. Todavia, se buscarmos apoio na área das finanças comportamentais que estudam as ilusões cognitivas dos investidores, poderemos entender como tomar boas decisões e nos tornarmos menos vulneráveis aos princípios que guiam nossas mentes.

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Desejo imediato

No livro Comporte-se: a biologia humana em nosso melhor e pior, do professor Robert M. Sapolsky, explora as diferentes camadas que compõem cada um dos comportamentos humanos, buscando entender como nosso cérebro evoluiu em paralelo com a cultura e como essa complexa dinâmica ajuda a definir os impulsos que nos moveram ao longo da história.

[…] “agressividade, violência, compaixão, empatia, simpatia, competição, cooperação, altruísmo, inveja, Schadenfreude, desdém, perdão, reconciliação, vingança, reciprocidade e (por que não?) amor. Tudo isso nos arremessa em um atoleiro de difinições.”

O primeiro capítulo do livro chamou a minha atenção ao fato de que as dificuldades encerradas pelas questões acima, além de atual, podem ser transportadas para todas as áreas em que emitimos uma opinião, levando-nos equivocadamente pensar que a enunciação opinativa é algo original.

Caso levássemos esse ponto para a política, nossas simpatias e paixões nos levariam a cometer inúmeros erros. Isso, segundo Maquiavel, no século 15, é mortal para a construção do bem comum ou coletivo.

Mais adiante Sapolsky diz:

“Por que a dificuldade? […] uma das razões disso é que muitos se tornaram campos de batalha ideológicos sobre a apropriação e a distorção de seus significados. As palavras têm poder e tais definições são carregadas de valores, muitas vezes idiossincráticos”.

Muitos investidores são acometidos, por exemplo, pelo efeito manada, ou seja, guiar-se não pela estratégia ou pelo planejamento financeiro, mas tomar decisão por impulso e sem o conhecimento necessário a uma tendência em que vários outros investidores estão fazendo.

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Neste caso, a frustração pode ser grande devido ao desejo imediato. As tendências comportamentais no mundo dos investimentos podem se refletir quanto à maior facilidade em perceber recompensas imediatas. Exemplos disso podem ocorrer quando somente é observado:

  1. A performance exitosa de um determinado fundo de investimento olhando para a rentabilidade passada. Isso não é garantia de que no momento da realização do aporte financeiro (presente) para frente (futuro) teremos o mesmo sucesso da performance pretérita. Equipe, gestores, premissas e racional são, neste caso, relevantes;
  2. A valorização substancial do papel de um ativo acionário em um curto período. Ou mesmo, entrar na bolsa seguindo o efeito manada via recordes do Ibovespa. Aqui, as ações das empresas listadas, principalmente as smallcaps, devem ser compreendidas como investimento de longo prazo, diminuindo a sensação de stress gerada pela intensa volatilidade no curto prazo.

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Recompensas no longo prazo

Por outro lado, temos dificuldades em reconhecer recompensas no longo prazo. Pensar em ganhos no longo prazo exige um adiamento do desejo imediato, por meio de uma análise mais cuidadosa, precisa e consistente das situações. Exemplos disso podem ocorrer quando deixamos de lado:

. A previdência privada como fator de proteção, independência e qualidade de vida na velhice;
. O planejamento sucessório a partir de estratégias empresariais de sucessão. Este é um caso fundamental para perpetuar o patrimônio que se construiu em vida;
. A diversificação do portfólio de investimentos;
. A compreensão de que investir em ações é investir em empresas. Nesse sentido, o exercício de questionar-se como ela estará nos próximos anos, além o setor de mercado em que atua são pontos importantes para mitigar possíveis riscos.

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Adoramos e detestamos

O livro A cabeça do investidor, da professora de psicologia econômica Vera Rita de Mello Ferreira, explica o quanto podemos ser afetados pelas ciladas da mente ao investir. A professora criou um quadro interessante que nos ajuda a pensar sobre os contextos e situações que podem nos causar prazer ou frustração no processo decisório do investidor.

ADORAMOS

DETESTAMOS

Alívio de tensão e gratificação imediatos

Perdas e faltas

Desconsiderar consequência

 

Cenários desconhecidos, incertos e ambíguos

Acreditar que tudo está bem e que seguirá assim eternamente

Reconhecer que erramos, que somos limitados e que temos aspectos destrutivos

Ganhar (tudo e qualquer coisa)

 

Tudo o que contraria nossas crenças, expectativas e desejos

Tudo o que combina com o que acreditamos

Ficar de fora

Ter companhia (inclusive para errar junto)

Considerar o longo prazo

Ser aceitos e sentir que pertencemos (a um grupo ou situação)

Pensar e tomar decisões

Lembre-se sempre: tomar boas decisões torna-se também um desafio de controlar as próprias emoções e comportamentos, pois nem sempre aquilo que provoca prazer significa a melhor escolha.

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